Proprietários da Covela recuperam os vinhos da Fundação Eça de Queiroz
A parceria entre as duas quintas de Baião passa também por um apoio de cidadãos brasileiros às actividades culturais da Fundação que gere a casa-museu do escritor.
São duas casas históricas, ficam a pouca distância uma da outra, e a elas estão ligadas duas grandes figuras da cultura portuguesa: o escritor Eça de Queiroz e o cineasta Manoel de Oliveira. Agora, a Quinta da Covela e a Fundação Eça de Queiroz, sedeada na casa de Tormes, em Baião, onde se encontra o espólio de Eça, unem-se – pelas vinhas e o vinho, mas não só.
O grupo Lima Smith, que tem a Quinta da Covela na região dos Vinhos Verdes e as Quintas das Tecedeiras e da Boavista no Douro, vai passar a ser responsável pela produção dos vinhos da fundação sua vizinha. É uma história de boa vizinhança que passa muito pelas relações pessoais e pela paixão do britânico Tony Smith pela região.
Apercebendo-se das dificuldades da fundação, sobretudo depois dos cortes nos apoios sofridos nos anos da crise, Tony começou a pensar na hipótese de uma “parceria de longo prazo” na área dos vinhos, com benefícios para ambos os lados.
Permitiria o aumento do portfólio de vinhos da Lima Smith, o alargamento da área de vinha, que na Covela já começa a ser pequena para a procura que os vinhos têm, e, ao mesmo tempo, ajudaria a fundação a ultrapassar os problemas financeiros. O acordo fez-se e foi anunciado nesta quarta-feira, no muito adequado cenário do Grémio Literário, em Lisboa.
O sócio de Tony Smith, o brasileiro Marcelo Lima, e a sua mulher, Beatriz Kopschitz, grandes apreciadores da obra de Eça, entusiasmaram-se ainda mais com a ideia e decidiram criar uma Associação de Amigos da Fundação no Brasil, que “patrocinará as suas actividades e ajudará – através de jantares, tertúlias e outros eventos culturais ligados à figura e obra de Eça – a dinamizar a fundação e os seus trabalhos”.
Para já, explicou Marcelo Lima à Fugas, os mais empenhados em participar têm sido brasileiros a viver em Portugal, mas espera que a ideia desperte interesse também no Brasil.
O almoço no Grémio serviu para apresentar os mais recentes vinhos da Covela, mas também para tornar pública a parceria. Tony Smith disse que só a partir da vindima deste ano é que o enólogo da Lima Smith, Rui Cunha (que já trabalhou no passado nos vinhos da fundação), irá ocupar-se do projecto.
São, ao todo dez hectares de vinha onde se encontram sobretudo as castas Avesso, Arinto, Alvarinho e Chardonnay plantadas num solo granítico. São elas a base dos vinhos que a Fundação criou – a marca mais conhecida é Tormes, mas existem outras como a Fundação Eça de Queiroz ou O Mandarim. Além disso, declarou Tony Smith, ainda há muito a explorar “em torno do universo de Eça de Queiroz” e desta casa de Tormes que inspirou o livro A Cidade e as Serras.
É cedo para tomar decisões sobre o que serão, no futuro, os vinhos da Fundação Eça de Queiroz, mas Tony Smith lembra que no passado “o espumante era muito bom”. Quanto à possibilidade de fazer um Alvarinho (casta que não existe na Covela e que em Tormes foi plantada há poucos anos) não é a que mais interessa aos proprietários da Covela, mas nada está para já excluído.
O que sabem é que a parceria será vantajosa para ambos os lados na área do enoturismo, unindo de forma mais efectiva as duas quintas de Baião, uma região onde, diz o britânico, o turismo tem vindo a crescer mesmo sem ter havido uma campanha para isso. “Não há brasileiro que vá à Covela e que não queira visitar a Fundação”, conta Marcelo Lima. “E geralmente ficam surpreendidos por ver que são tão próximas”.
Afonso Eça de Queiroz Cabral, presidente do Conselho de Administração da Fundação, também presente no almoço no Grémio, explicou que há 20 anos que esta desenvolve uma programação cultural, com cursos de Verão, concertos e, mais recentemente, a criação do prémio literário Fundação Eça de Queiroz, com o apoio da Câmara Municipal de Baião.
Além disso, explora o Restaurante de Tormes, onde se serve uma ementa queirosiana que inclui, claro, o célebre arroz de favas que, na sua simplicidade, deslumbrou Jacinto, a personagem principal de A Cidade e as Serras – o mesmo Jacinto que se aborrecia com o campo e que “em Paris sempre abominara favas”.