A cantina do polvo que o povo adora
É em assadeiras de ferro e com arroz do forno que o molusco octópode é servido no Olhinhos de Polvo.
É diferente e, por isso, uma salutar divergência no meio da multidão de restaurantes que em Matosinhos oferecem peixes e mariscos. Este é especializado no polvo e oferece pouco mais. Mas de uma qualidade e apuro de sabores que o tornam num caso especial e muito procurado. Também na organização da carta esta é uma casa que prima pela divergência, sem preços e praticamente sem escolhas.
No Olhinhos de Polvo, o molusco octópode serve-se assado ou em filetes, havendo também os filetes de pescada e de bacalhau. Ao cliente compete apenas indicar a preferência, já que os 12,50€ que são cobrados pela refeição incluem também uma entrada, sobremesa, vinho e café.
Daí que em vez de restaurante se mostre mais apropriado falar-se antes numa espécie de cantina. A cantina do polvo, que é o que atrai a generalidade da clientela que permanentemente esgota a lotação da casa.
É certo que não é avantajado o espaço deste restaurante, instalado numa das lojas de um prédio moderno no extremo sul da rua que vai até à lota e porto de Leixões. Uns trinta e tal lugares inundados pela luz natural que entra pelas paredes de vidro e uma acústica que pouco pode ajudar nos dias em que a clientela se mostra de voz mais afinada.
Depois de várias tentativas frustradas, foi ao almoço de domingo e com marcação antecipada que conseguimos lugar à mesa no Olhinhos de Polvo. Toalhas de linho brancas, guardanapos em papel, baixela adequada e um ambiente de estilo próximo e familiar.
A carta, plastificada, mostra que o “polvo assado no forno com arroz do mesmo” e os “filetes de polvo com arroz do mesmo” são “especialidade” da casa. Seguem-se o polvo assado na brasa, os filetes — de pescada e de bacalhau —, arroz — à pescador ou de camarão — e açorda de camarão. Para quem preferir carne: “Batata saloia”, que nos explicaram tratar-se de lombo de vitela em tiras salteadas em azeite com batata e cebola.
Ao cliente compete apenas escolher o prato e o tipo de bebida. E vinho? “Branco ou tinto. Pode beber o que quiser, não pode é escolher”, eis a resposta. A alternativa é, pois, levar de casa já que é disponibilizado apenas um vinho de entrada de gama de um único produtor. Uma pena, já que a qualidade da cozinha bem merece o desafio de vinhos a condizer.
Efectuadas as escolhas, foi servida para entrada uma afinada pasta de marisco com cebola e pimento, acompanhada por fatias finas de brilha de milho. Fresca, saborosa e de agrado geral.
Além do polvo assado, escolheram-se também os filetes. Primorosos os de pescada, fresca, brilhante e húmida, e envolta por fina capa de ovo e farinha em fritura leve e impecável. Acompanharam com arroz solto de tomate, que chegou à mesa em tachinho de ferro e só não atingiu a perfeição pela utilização da variedade agulha em vez do nosso carolino, que lhe dá a goma e melhor se envolve com os sabores. E bem que merecia pela forma competente como foi cozinhado.
Igualmente de cuidada execução e sabor afinado, os filetes de polvo, com as partes finas dos tentáculos bem envolvidas pela fritura com cobertura de ovo e farinha, que prepararam a chegada do cozinhado-estrela.
O polvo assado chega à mesa numa assadeira de ferro, que é dividida a meio para acomodar também o arroz. Tentáculos de média dimensão e sabor imenso, macios, tenros e viciantes. A cor e o sabor acentuados denunciam a utilização de vinho tinto, da casta vinhão, que igualmente enriquece o arroz de grão aberto e saboroso (mesmo sendo agulha), que se mantém húmido depois da passagem pelo forno. Enriquecido com as pontas do octópode, o arroz mostra ainda a utilização de boa gordura (azeite) que lhe intensifica o sabor.
Nas sobremesas, a “especialidade” é o soufflé de claras, que é tostado com o rum em fogo que chega à mesa na casca do ovo, mas não se arrependerá quem optar antes pela tarte de amêndoa, de muito boa execução.
Num conceito muito próprio, e divergente, a informalidade e o estilo familiar caracterizam o ambiente e o serviço. Quando a cozinha é competente e o produto é bom, os vinhos têm que estar à altura e o preço não tem que ser uma obsessão. Mesmo assim, o polvo reina e o povo adora. Um reinado com base numa receita particular e a mão certa e segura da cozinheira, numa feliz parceria com o marido, que se encarrega da sala e trata das sobremesas.
Olhinhos de Polvo
R. Heróis de França 669
4450-159 Matosinhos
Tel. 916 006 021
Estacionamento nas ruas envolventes (nem sempre fácil)
Pagamento em numerário (não aceita cartões)
Aconselhável marcação
Fecha aos domingos e jantar de segunda