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Meninas que torcem o pepino!

Às vezes penso que ser homem ou mulher nos poderia definir tanto como a cor dos cabelos ou o tamanho dos pés. Poderia, mas não é isso que acontece.

Os órgão genitais definem de modo estrutural a forma como as nossas sociedades estão organizadas e, consequentemente, as crianças são socializadas em conformidade. O pepino é torcido desde cedo e sempre para o mesmo lado. No mundo ocidental cada vez menos felizmente, mas muito, demais ainda. É por esse motivo que esta crónica existe e suscita discussão.

Ainda a cegonha não trouxe o bebé e já a máquina responsável por masculinizar ou feminizar as futuras pessoas funciona a todo o vapor. Tudo começa com a cor da roupa e os brinquedos. Seguem-se as actividades extra-curriculares. A autonomia para as saídas à noite. As responsabilidades domésticas. O estímulo ou a censura para as aventuras amorosas e experiências sexuais. A orientação escolar e profissional. Tudo isto e muito mais.

Poderão os mais críticos e optimistas argumentar que com eles não foi nada assim, que hoje as coisas estão diferentes... A metáfora do copo meio cheio ou meio vazio é sempre uma boa forma de demonstrar que o modo como avaliamos a realidade depende da perspectiva. No entanto, não me tentem convencer que o copo está completamente cheio!

Como futura mãe e feminista, questiono-me sobre a melhor forma de educar uma criança neste mundo tão quadrado, tão preto e branco, sem cair numa ideologia de terraplanagem da cultura onde a criança deverá sentir-se, em certa medida, enquadrada. Com certeza a Mariana vai brincar com bonecas, vestir vestidos cor-de-rosa (já tem alguns à sua espera e muito agradeço as ofertas) e, quem sabe, frequentar aulas de ballet. Nada disso me incomoda. O que eu quero evitar é que as suas experiências e vivências se resumam, se restrinjam, àquilo que entendemos, enquanto sociedade, ser adequado a uma menina. Será que a Mariana vai gostar de jogar à bola, engenharia aeroespacial e mecânica? Obviamente não sei e não desejo especialmente que sim, apenas quero que ela tenha a oportunidade de descobrir a resposta.

Esta postura moderada e conciliadora com o mundo que me rodeia terminará no dia em que alguém ouse oferecer-lhe um trem de cozinha ou um ferro de engomar de brincar. Aí viro bicho! (brincadeirinha)

Socióloga, autora do blog super-mulher