Pedro Cunha/Arquivo

Meia laranja... Perfeita?

“Quero que saibas que conseguiste surpreender-me com as iniciativas que tens tido. Tem sido muito bom assumires as compras do supermercado porque já estou a pensar que consigo ter o final de dia para mim. Vai  fazer-me bem.

O nosso piquenique foi muito bom! Tão romântico! Mas principalmente porque falámos sobre coisas de que já tinha muita saudade.

Acho que tens razão e que temos que começar a programar os nossos encontros, senão tudo o resto parece prioritário! Temos que cuidar de nós. E perceber que posso contar contigo desta forma, faz crescer em mim a vontade de continuar este caminho ao teu lado. Só assim vale a pena. Obrigada por me fazeres tão feliz e cuidares de mim!

Deixei-te um sumo de laranja no frigorífico!”

Amo-te muito!

Tânia"

A pessoa perfeita não existe por si só. Não existem pessoas perfeitas, homens ou mulheres perfeitas, existem somente relações mais compensadoras que outras.

O desejo de ter uma vida amorosa sempre cor-de-rosa como em contos de fadas representa uma visão imatura e com pouca realidade da vida. Este 'estado' cria um sentido de urgência que nos faz reagir com o outro de uma forma pouco espontânea, procurando agradar constantemente, escondendo, muitas vezes quem realmente somos e como queremos viver. Jogamos à defesa para não desiludir ou sermos desiludidos com um novo falhanço no investimento de uma nova relação.

A idealização em demasia das pessoas ou das relações pode vir a reflectir a incapacidade de aceitar as imperfeições do Outro ou os seus erros. Nestes casos, há quase um desejo inconsciente de querermos que o Outro seja igual a nós ou que faça tudo como nós faríamos. Esquecemo-nos de que, se assim fosse, o outro não traria nada de novo à nossa vida. Esperar que seja o Outro a resolver os nossos mal-estares, problemas ou sentimentos de vazio, é uma espera inglória e sem retorno. Esse é um caminho sempre solitário, individual e de auto conhecimento.

Aceitar que uma vida a dois tem momentos de felicidade e dificuldade é revelador de maturidade e sentido de realidade. É suposto que nos sintamos cuidados e amados, mas sem esperar uma vida a dois com uma paixão intensa e eterna. As pessoas que têm a noção de que uma relação implica inevitavelmente fases de dificuldades, e que têm, acima de tudo, muita vontade de as ultrapassar, poderão, um dia, vir a sentir que encontraram a pessoa certa, quando encontrarem alguém que esteja disposto a percorrer este caminho com elas.

A consciência de que nem tudo está garantido na relação com o Outro é fundamental. A relação tem que ser alimentada e reinventada. O Outro tem que ser cuidado, olhado e investido todos os dias.

É um desafio constante, diário, mas que representa o verdadeiro sentido de existência e manutenção de uma relação de casal.

Os sacrifícios e as cedências deverão ser, contudo, continuadamente alternadas entre os dois membros do casal para que uma relação seja equilibrada e saudável. Este jogo em que se ultrapassam obstáculos exige um trabalho contínuo no sentido da mudança do que não corre bem na relação. O grande objectivo deverá ser sempre cuidar do outro e dar-lhe aquilo que ele precisa, diariamente. Só assim podemos ir confirmando que a relação evolui e que a pessoa que está ao nosso lado está para o melhor e o pior. Se ouvirmos a voz do coração, vamos saber que encontrámos a nossa meia laranja... mas que não é perfeita.

Psicóloga familiar