PÚBLICO

A arte do elogio de Miguel Esteves Cardoso... Precisa-se!

Redacção de férias do Francisco

“Este ano as nossas férias foram diferentes! Não fomos para o Algarve para onde vamos todos os anos. Fomos para a casa da Praia Grande, da minha bisavó. Fomos eu, o meu irmão, o meu tio e as minhas irmãs emprestadas. Ali, íamos a pé para a praia ou íamos no jipe todo-o-terreno do tio.

Na praia encontrávamos amigos da escola e estávamos horas a brincar! Comíamos gelados ou bolas de Berlim! Tivemos sorte porque muitas noites fomos às feiras das Azenhas, de Colares e de Janas. Eu adorei! Andávamos nos carrinhos de choque e ganhávamos nas rifas! Mas o nosso programa preferido foi ir à piscina da Praia Grande! Adorámos saltar das pranchas e ficar dentro da piscina à espera das ondas que vinham do mar e caíam por cima de nós! A mãe era a mais medrosa e tinha medo de mergulhar!

Lá na piscina conhecemos o Miguel Esteves Cardoso e a Maria João! Eu não sabia quem eram mas o tio explicou que era um escritor famoso e a mulher dele! Ela era linda! E também adoravam estar na piscina à espera das ondas do mar!  Ele escreveu no jornal PÚBLICO sobre nós e disse que éramos uma família que mergulhava muito bem e que éramos a família mais feliz que ele já tinha visto! Só não percebi porque deu o título de Aprender a Nadar, porque nós já sabemos nadar! E bem, como ele disse!  A mãe e o tio ficaram tão felizes... mas não percebi bem porquê! Nós gostámos de sair no jornal!

Adorei as minhas férias!

Francisco"

Os elogios são tão mais eficientes no sentimento de validação do Outro, quanto mais específicos e verdadeiros forem. Para elogiar temos que estar atentos ao Outro. Estar atento significa olhar para as suas vulnerabilidades, para as suas competências reais, para o caminho que vai sendo percorrido entre êxitos, fracassos e aprendizagens. E para mantermos esta atenção temos que ter alguma capacidade de alheamento de nós próprios, a par de uma segurança individual que nos permite a elevação do Outro, sem que nos sintamos ameaçados ou menosprezados.

A troca de elogios sinceros pode aliás contribuir para uma evolução nas relações interpessoais. Quem recebe o elogio sente reforçado o seu esforço, a sua escolha ou sente simplesmente que é olhado. Quem elogia sente a satisfação profunda de ter uma participação activa e construtiva no percurso do Outro. A capacidade de aceitar ou manifestar alegria por quem recebe, também transmite a quem elogia que se acredita no seu julgamento, na sua sabedoria, no seu bom senso e na sua verdade. Reforça e mostra à outra pessoa que aquilo que ela diz é importante. Há portanto, um sentimento de valorização mútuo para quem dá e para quem recebe.

Se pensarmos nas relações no nosso local de trabalho, temos certamente memória da satisfação que sentimos quando um superior ou colega valorizou o nosso empenho, contribuindo para a transformação daquela relação, além da maior tolerância que provavelmente passamos a ter quando nos dirige uma crítica negativa. E também, as vezes em que calámos um elogio sincero, apesar do reconhecimento de que merecia ser dado! Mas é tão difícil  reconhecer o Outro! Parece representar uma espécie de ameaça à (in)segurança na nossa competência ou posição adquirida, que não queremos ver ameaçada por nada! Muito menos por um elogio a um colega!

Quanto maior a intimidade, mais cuidadosos e verdadeiros deveremos ser na hora de elogiar. A partilha de elogios entre  amigos e família é uma responsabilidade acrescida, pois contribuímos afectivamente na construção Outro enquanto ser humano.

Nos primeiros tempos de enamoramento, o elogio está quase sempre presente na relação do casal, de uma forma que por vezes nos ridiculariza por excesso de abuso e desproporção! Pelo menos aos olhos de outros, que por entre a ironia e o desejo de estar no mesmo estado de alienação, pensam: “Ai filha, quando acordares p'rá vida, aí sim, é que eu vou querer estar cá p'ra ver!”. Mas também sabemos que com o passar dos anos, em muitas relações de casal, o elogio dá lugar a uma crítica negativa quase permanente, que em tanto contribui para a degradação e separação emocional do casal.

O elogio dentro do universo infantil deve ser cultivado, sobretudo em tenras idades, pela valorização dos aspectos positivos que se observam e distinguem na relação de empatia com o outro, em comportamentos positivos ao nível da regulação das emoções, controlo dos impulsos, capacidade de gestão da frustração, entre outros. Mas é fundamental para o entendimento dos mais novos que o façamos de forma objectiva e clara, respeitando o pensamento concreto que domina nestas idades. E mais importante ainda, que não se caia no elogio fácil e superficial, que só serve para gerar confusão ou insegurança, pela dose de incongruência que tem, e que os mais novos tão bem identificam!

A arte de elogiar também representa por parte de quem o faz, a arte de olhar a vida mais pelo lado positivo que negativo, de valorizar mais o bom que o mau, de agarrar as oportunidades para desenvolver uma atitude mais optimista e construtiva sobre o mundo e as relações. O nosso querido Miguel Esteves Cardoso (MEC) parece ter este dom e sobretudo procura desenvolvê-lo, sempre que deixa o seu testemunho por escrito, no elogio à Vida, a Portugal, ao Amor, à Maria João, à Amizade, a Colares, à Praia Grande, ao Hotel das Arribas, à Churrasqueira de Janas, entre outros. Fá-lo de uma forma transparente, sincera na forma como se expõe e se dá a conhecer. Imagino que pudesse fazer as suas crónicas de muitas perspectivas, ou até que o faça de forma determinantemente diferente desde que ama a Maria João. Como diz uma grande amiga minha há um Miguel antes e depois da Maria João! Mas a verdade é que nos banha constantemente com o seu olhar carinhoso e apreciador das qualidades dos outros que tanto emociona quem o lê.

A redação de férias do Francisco espelha isso mesmo! A forma como se sentiu feliz por este “escritor famoso” ter reparado que mergulhava bem e que fazia parte de uma das famílias mais felizes do mundo de MEC. Não sei se o escritor teve consciência do impacto do seu elogio nesta criança e nesta família, que tem feito o seu melhor para, nestes últimos anos, “aprender a nadar numa nova vida!”

Bem haja!