Psicóloga de Família

Eles, elas e as diferentes formas de dizer
Tânia: Achas ou não?
Miguel: O quê, Tânia?
Tânia: O quê?! Estás a gozar comigo?!
Miguel: Não, claro que não...
Tânia: Então eu estou aqui a falar há meia hora e tu nem sequer estás a ouvir?!
Miguel: Claro que estou... e concordo... mais ou menos disseste tudo...
Tânia: Disse tudo o que Eu penso! Agora queria ouvir o que Tu pensas! Mas dá muito trabalho, não é Miguel? Falar para ti é uma tarefa deveras estafante!
Miguel: Não exageres, Tânia! Lá porque nem toda a gente gosta de discutir tudo, a toda a hora, ao ínfimo pormenor, não significa que se esteja a borrifar!
Tânia: Pois olha, se não te estás a borrifar, disfarças mal!
Miguel: Estás a ser injusta... Tu já tinhas o teu discurso todo preparado na tua cabeça... Aposto que andas a pensar nisto há semanas! Eu levo de repente com tudo em cima?! Calma! Nunca tinha pensado assim... dessa forma...o que te posso dizer é que não concordo com o dramatismo com que tu olhas para isto. Eu acho que nós até conversamos bastante...
Tânia: É fantástico! Bastante?! Parece que estás sempre a fazer um frete para me ouvir! Olha, é melhor realmente pensares primeiro no que te disse e falarmos noutro dia...
Miguel (beija-a): Mas adoro-te! (sorri)
Tânia: Sabes é muito! Mas fica sabendo que continuo preocupada!
Sim, somos diferentes! Homens e mulheres pensam, sentem, agem e dizem de forma diferente. Olham a vida e as relações com lentes distintas. Gerem e manifestam os afectos particularmente. Enfim, na realidade, comunicam de forma diferente.
Há umas décadas, os homens detinham o poder de forma mais ou menos latente e manifesta na relação conjugal. Com a emancipação profissional, as mulheres conquistaram poder e ganharam espaço de afirmação a muitos níveis. Anteriormente, os papéis encontravam-se mais definidos e o poder de gestão da relação mais centralizado nas “mãos” masculinas. Ao longo do tempo, este cenário foi-se alterando dando espaço a uma maior iniciativa, intervenção e decisão no feminino. Os contornos de união viram-se progressivamente alterados para uma distribuição mais equitativa do poder. As relações parecem nesta época mais agitadas, mais questionadas, e quem sabe, mais verdadeiras! Pelo menos, assim o desejamos!
Os homens são regra geral mais acomodados, e as mulheres revelam, geralmente, uma maior capacidade para lutar pela relação, trazendo a lume questões com as quais não se sentem confortáveis e desejam ver alteradas. As mulheres agitam as águas, enquanto os homens desejam manter-se num mar alto e tranquilo, onde tenham sobretudo momentos de alguma paz e silêncio.
As mulheres desejam que os homens falem! Querem saber o que sentem, o que pensam, discutir todos os temas aprofundadamente até ao mais ínfimo pormenor. É uma necessidade quase visceral! Como se o facto de isso não acontecer pusesse realmente em risco a sobrevivência da relação. É o tudo ou nada! As decisões têm que ser imediatas e torna-se difícil conviver com os não ditos ou com o tardar das conversas.
O silêncio deles é tantas vezes entendido por elas como ausência, desinteresse ou falta de investimento na relação. As interpelações femininas são por eles sentidas como inquietações, que causam desassossego e possibilitam levantar questões que podem pôr em perigo a estabilidade conjugal.
A comunicação pode resultar negativa para a relação pela insistência na crítica, tantas vezes característica do sexo feminino. Esta tendência resulta quase sempre num movimento de afastamento ou retirada, mais comum nos homens. O elogio e a alegria pelas conquistas do Outro deveriam ser mais frequentemente manifestados e alimentados na vida diária dos casais.
As relações só se vêem equilibradas se o casal aceitar dançar aos dois estilos! Seja mais ao estilo masculino ou feminino, a comunicação é o que nos liga aos outros e permite pôr em comum ideias, sentimentos e experiências. É, portanto, fundamental desenvolver a capacidade de comunicar regularmente com o outro.
As relações crescem e enriquecem com a impetuosidade feminina e a descontração masculina! Homens e mulheres têm muito a aprender uns com os outros! Aprender a fazer com o fazer do Outro, e introduzir isso na gestão dos diálogos do dia-a-dia. Se há momentos em que dialogar sobre determinado tema é indispensável, outros há em que não o devemos fazer. É a continuidade de uma relação que permite este auto-conhecimento de nós, do outro e do que a relação suporta. É um exercício exigente e difícil, mas que poderá proteger o outro e a união. De facto, respeitar os terrenos pantanosos de uma relação é, muitas vezes, não “andar” muito sobre eles.
Partir para o diálogo com um sentido de protecção, mais do que seguir o impulso de querer ganhar a discussão ou provar a razão. O exercício de escuta activa do Outro é algo que importa cultivar. Porque é que ouvir o Outro é sempre tão difícil para nós? Porque sabemos que corremos o risco de alterar as nossas ideias pré-concebidas ou as nossas verdades absolutas. Mas não será essa, tantas vezes, uma permissa necessária para nos aproximarmos mais do Outro?