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Nutrição

Apetece-lhe um caramelizado de libélulas e térmitas?

Os insectos têm muito mais para oferecer à nossa alimentação do que o que pensa.

A recente publicação do livro Insectos comestíveis: perspectivas futuras para a segurança alimentar, sob a chancela da Organização para a Alimentação e para a Agricultura (FAO), mediatizou a entomofagia humana. Mas o assunto de novo tem muito pouco.

Os insectos fazem parte dos hábitos alimentares de mais de um quarto da população humana, sobretudo na Ásia, África, Oceânia, América Central e do Sul, sendo consumidos tanto na fase larvar como na fase adulta. Contudo, para a maior parte de nós, "ocidentalizados", só a ideia de consumir insectos provoca expressões faciais que afastam quem bem-intencionado quiser colocar no nosso prato uns gafanhotos fritos com chilli e lima, umas larvas de vespa com molho de soja ou mesmo um caramelizado de libélulas e térmitas. Preferimos, sem hesitar, os seus primos que vivem no mar, os crustáceos (camarões, santolas, lagostins, lavagantes e lagostas, entre outros), e fazemos fila para comer um bom arroz de marisco. 

Mas são várias as razões para não pôr de parte este recurso alimentar tão vasto. 

Muitos insectos são fonte de proteínas, ácidos gordos essenciais (ómega-3 e ómega-6), minerais e vitaminas comparáveis às carnes de porco, vaca e aves ou aos peixes. 

Os insectos são animais de sangue frio e, por isso, não despendem energia para se aquecerem, o que os torna muito eficientes no processo de conversão dos alimentos que comem em massa corporal (essencialmente proteína): para produzir a mesma quantidade de proteína gasta-se para alimentar vacas durante um mês, a quantidade de ração suficiente para seis meses a alimentar frangos ou para um ano a alimentar insectos. E, como a necessidade de ração determina a área cultivável necessária, criar insectos é também neste aspecto uma actividade menos exigente: numa área equivalente a um campo de futebol utilizado para criar vacas produz-se proteína em quantidade equivalente à que se produz a criar insectos apenas na grande-área (cerca de 1/12 da área total do campo). 

Produzir proteína recorrendo a insectos é portanto uma actividade bem mais eficiente do que fazê-lo criando vacas, porcos ou aves. Usa-se menos solo, menos água, recursos naturais limitados e emite-se menos gases com efeito estufa. Mas, no contexto da segurança alimentar (que envolve o fornecimento presente e futuro de alimentos à população humana e aos animais de criação) o interesse dos insectos não fica por aqui. 

A curto prazo, a criação de insectos para incorporação em rações, principalmente para peixes e mariscos, afigura-se como uma das mais importantes aplicações. Os insectos podem ser alimentados com vários tipos de resíduos orgânicos, por exemplo, restos de alimentos provenientes de cozinhas domésticas e de restaurantes, para servir de fonte proteica em rações que alimentem a crescente população de peixes e mariscos de aquacultura que, imagine-se, consomem cerca de um quinto do peixe capturado em alto mar. Existem já algumas empresas pioneiras a operar neste sector.

Na Europa, a utilização de insectos na cadeia alimentar passará pelo consumo de peixes, mariscos ou mesmo aves e porcos alimentados com rações proteicas que incorporem estes pequenos artrópodes. Ir hoje a um restaurante comer uns croquetes de larvas de tenébrio talvez seja apelativo apenas para o consumidor mais inovador. Mas importa não esquecer que as populações que comem insectos fazem-no porque gostam.

 

Nutricionista e professor
Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação Universidade do Porto
dupamato@fcna.up.pt