Kimberly White/Reuters

Nutrição

O chocolate causa borbulhas?

A acne pode afectar 40 a 54% dos indivíduos acima dos 25 anos, e 79 a 95% dos adolescentes. A possibilidade da alimentação modificar a ocorrência da acne, bem como a sua gravidade, tem sido levantada ao longo dos anos, com avanços e recuos no que se pensa serem os alimentos mais ameaçadores.

Na segunda década do século passado, alguns investigadores responsabilizaram  o chocolate pelo aumento da produção de gordura pelas glândulas sebáceas e pela gravidade da acne, mas uns anos depois, em 1969, outro grupo colocou indivíduos com acne, expostos a chocolate ou placebo, e não encontrou nenhuma associação daquele alimento com o desenvolvimento de acne. Este estudo apresentava várias limitações e pode ter contribuído para a generalização de um pensamento em que a alimentação não tinha influência na acne. E, durante cerca de 40 anos, relativamente pouco se iria passar no estudo deste domínio científico.

Contudo, os grandes avanços no conhecimento dos mecanismos ligados ao aparecimento da acne e o constante desenvolvimento de ferramentas epidemiológicas e espírito crítico para estudar as relações entre alimentação e doença, permitiram reanalisar esta associação e estudos recentes abrem portas a novas descobertas.

Assim, entre 2005 e 2012, quatro importantes estudos mostraram que consumir leite apareceu associado a acne, tornando necessários trabalhos futuros com “desenhos” mais robustos para aprofundar aquela eventual relação. Curiosamente, e de forma contrária, o consumo de leites fermentados enriquecidos com lactoferrina (uma proteína originalmente isolada no leite e, por vezes, denominada como o “canivete suíço” do sistema imunológico) mostrou um efeito benéfico na acne.

A investigação recente tem focado também o papel da carga glicémica da alimentação na modificação de factores reguladores da produção hormonal e do metabolismo que, por sua vez, interferem na ocorrência da acne. Mas o que é a carga glicémica dos alimentos? 

De forma muito simplificada, a carga glicémica traduz um valor numérico que reflecte o esperado quanto à capacidade de cada alimento de aumentar a glicose (açúcar) no sangue. Isto é importante dado que quanto maior for essa carga, mais se exige ao organismo em termos de resposta de produção de insulina (a hormona que regula o açúcar no sangue).  

O excesso crónico de alimentos açucarados ou com alta carga glicémica pode submeter o organismo a um ambiente com elevado potencial para aumentar a produção de insulina. E é o caldo metabólico de hiperinsulinemia que possibilitará disparar outros factores implicados no desenvolvimento e agravamento da acne. Por isso, espera-se que uma alimentação de baixa carga glicémica contrarie a instalação daquele estado de hiperinsulinemia.

Enquanto ainda estamos longe de precisar o papel de todos os factores interferentes na potência glicémica dos alimentos e no desenvolvimento da acne, escolher uma alimentação de menor carga glicémica não é complicado. Para esse objectivo destacamos: preterir alimentos açucarados e, para obter a energia proveniente de “farináceos”, privilegiar as massas - sem esquecer as integrais, e outras como as massas com cores e sabores provenientes de vegetais ou adição de vitamina D, por exemplo) - e leguminosas, complementadas pela ingestão generosa de hortícolas e boas peças de fruta.

 

Pedro Moreira
pedromoreira@fcna.up.pt

Nutricionista e Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Nutrição da Universidade do Porto