Yael Adler é a autora de
Yael Adler é a autora de "O Fascinante Mundo da Pele" Nuno Ferreira Santos

Corpo

“Nenhum creme consegue imitar o que a nossa pele faz”

À excepção do protector solar, mais vale deixar a pele em paz. É o que diz Yael Adler, em "O Fascinante Mundo da Pele".

Quando o tópico de discussão é a pele, Yael Adler, doutorada em dermatologia, é frequentemente chamada para falar na televisão alemã. No livro O Fascinante Mundo da Pele, editado pela Lua de Papel e traduzido para 23 línguas, explica como funciona aquele que é o maior órgão do corpo humano e como devemos tratá-lo. É menos um conjunto de curiosidades – se bem que também as há – e mais um guia completo, escrito de uma forma acessível. O livro foi lançado esta terça-feira em Portugal e já está à venda (15,90 euros).

A entrevistada chega levemente maquilhada, para falar com o Life&Style. Não é por defender acerrimamente que se deve deixar a pele em paz, a fazer o trabalho que a natureza lhe incumbiu, que não reconhece as necessidades da vida moderna. “Não sou fanática”, garante. Ainda assim, avisa que a maior parte dos produtos de beleza tentam imitar aquilo que a pele já faz e acabam por só trazer problemas. O sabão que usamos diariamente no banho destrói a camada protectora da pele e os cremes – cheios de químicos – são soluções desnecessárias para combater esse desequilíbrio. O mais importante, diz, é estar informado e encontrar um balanço.

Porque decidiu escrever este livro?
Na minha clínica digo às pessoas todos os dias a mesma coisa. A pele está tão ligada a todos os órgãos e ao ambiente e gostava que toda a gente soubesse como o seu corpo funciona e o que cada pessoa pode fazer. Temos de ser independentes – da indústria, dos médicos, das farmacêuticas. 

Como é que se faz um balanço entre estar informado e não cair em extremismos?Se soubermos como funciona e confiarmos nas nossas habilidades não precisamos de dar ouvidos a todas as informações e modas. Um dos maiores problemas é que achamos que podemos manipular tudo – o envelhecimento, por exemplo. Ao lermos os jornais ou ao vermos televisão ficamos com a impressão que poderíamos prevenir o envelhecimento, a doença e a morte, usando um creme anti-rugas. Não é verdade, a barreira da pele é muito forte. Protege-nos contra o sol, frio, bactérias, vírus e químicos, mas também nos protege contra a entrada das substâncias antienvelhecimento. Não digo que a indústria faz mal, digo que a pele faz bem. Faz mais sentido comer alimentos que dêem micronutrientes à pele e lutar contra o envelhecimento a partir de dentro.

No livro desaconselha o uso diário de sabão. Porquê?
O sabão só existe para o cuidado do corpo há 400 anos – que é nada – e a evolução existe há milhões de anos. Se não desfizermos a barreira protectora da pele com lavagens vamos ver as bactérias saudáveis a aumentar. Se quisermos tomar um duche – porque já não somos pessoas da idade da pedra – podemos usar água diariamente, evitando sabão e detergentes sintéticos nos braços e pernas. Pode usar nas áreas onde se produz mais odor [debaixo dos braços e nos genitais]. O sabão tem um Ph de 9, por isso destrói o Ph acídico da pele, que demora oito horas a recuperar. Se usar sabão frequentemente vai estar sempre a destruir a barreira protectora.

É assim para todas as peles?
Sim, isto é a natureza. Só devemos usar creme se mesmo depois de quatro semanas ainda tivermos áreas secas.

Convence os amigos todos a seguir estas regras?
Não, porque eu só ofereço a informação. As pessoas que têm problemas tentam isto e depois dizem “funciona para mim”! Há pessoas que são viciadas em cremes e produtos de beleza. Enquanto não tiverem problemas, nunca vão mudar o seu estilo de vida. Mas o número de pessoas que têm problemas de pele está a aumentar.

As pernas são uma das zonas mais secas. Não justifica o uso de creme hidratante?
Pode-se usar, mas primeiro é preciso pôr de lado o sabão e o gel. Se rapar as pernas terá sempre pernas secas porque remove os lípidos. Recomendo cremes sem perfume. Um desenvolvimento maravilhoso da indústria são os cremes Derma Membrane Structure. São apenas lípidos parecidos com a epiderme em camadas e conseguem reparar a pele. 

Sobre que tópicos é que lhe deu mais prazer falar?
A coisa mais bonita é mostrar às pessoas o que a pele pode fazer e como nos pode proteger. Não sou fanática, às vezes considero os produtos úteis. Mas é preciso usá-los com sentido. Se usar um creme de cara, por exemplo, porque tem a pele seca das bochechas, então é melhor usar nas bochechas não na zona T. A nossa pele produz lípidos. O sebo é um creme hidratante maravilhoso para a cara e sai [dos poros] sobretudo de noite. De manhã as pessoas usam um sabonete e removem a gordura. E depois, o que sentem? Sentem tensão. Por isso, o que fazem? Usam um creme – um creme cheio de químicos, perfume e conservantes. Porque não manter o creme que produzimos à noite? Não há nenhum creme que consegue imitar o que a nossa pele faz para nós.

Realisticamente, como é que se pode não lavar a cara, de manhã?
Podemos lavar só com água e uma toalha. Também à noite. [Se fizermos isto] a pele recupera em quatro semanas.

A indústria cosmética em certos países asiáticos é bastante desenvolvida e os regimes de cuidado de pele podem ter nove ou mais passos. É tudo negativo?Bem, menos é mais. Para fazer de acordo com a natureza devemos usar apenas água e uma toalha. Tudo o resto é um distúrbio da natureza. Nada de creme de cara, de noite, olhos, ampolas, esfoliantes, máscaras... Nada é importante. Se formos influenciados pela civilização, vamos sempre mudar a natureza e ter um problema.

Como é que a maquilhagem se enquadra?
Mesmo que tenha maquilhagem, eu só uso água de manhã e à noite. Se tivermos uma barreira da pele saudável, a maquilhagem não nos vai fazer mal, desde que não esteja cheia de silicone e parabenos. Se [a maquilhagem] for demasiado pegajosa e oleosa, bloqueia os poros e não é saudável. Só uso maquilhagem em pó, com uma textura leve. Os minerais são substâncias da natureza que são usados para tratar problemas de pele, por isso não fariam mal à pele. Prejudiciais são os métodos de remover de forma demasiado agressiva e os perfumes. O rímel limpo com óleo.

Há quem use maquilhagem no ginásio. É perigoso?
Quando suamos, a pele fica mais sensível à entrada de substâncias. É melhor não termos tantos químicos na pele quando suamos, porque o risco de desenvolver alergias é mais elevado. Se a pele estiver húmida, a barreira protectora é mais macia. Quando as pessoas no ginásio suam e pegam nos pesos de metal, o níquel entra mais rapidamente na pele. O mesmo acontece com os relógios, quando suamos.

Com os tecidos também?
Sim. Se tiverem corantes ou pesticidas, podem chegar à pele. Por isso devemos lavar [a roupa] pelo menos três vezes antes de usarmos. 

Ainda assim, algumas mulheres não abdicam da maquilhagem…
Então usem maquilhagem leve, não demasiado oleosa – para que a pele respire –, com base mineral...

É seguro usar desodorizante?
Podemos usar antitranspirantes. Foram criticados por causa do alumínio, mas o alumínio é a terceira partícula mais frequente na crosta terrestre. Está em todo o lado – na água, no tomate, nas plantas. Se possível, evitar tudo isto, mas o desodorizante é mais ou menos seguro. Se tivermos uma barreira da pele intacta, esta protege a pele do alumínio. Se as pessoas suarem muito é bom terem um antitranspirante com alumínio. De outra forma, têm as roupas todas húmidas, a cheirar mal, e as infecções podem espalhar-se. O botox – que é ainda mais eficaz – também não é assim tão mau, apesar de ser tóxico. É preciso encontrar um balanço com tudo. Não sou fanática.

Tem uma abordagem bastante descontraída...
Não sou extremista, gosto de rímel, gosto de pintar o cabelo... Temos de encontrar o nosso balanço e estar informados. Depois, escolher o que queremos e o que não queremos. Há pessoas que ficam tão assustadas com tudo que já não conseguem viver. Mas em certos aspectos podemos agir: evitar perfume na pele, evitar solários e evitar tatuagens – são altamente tóxicas e nunca vão sair da pele.

Aquilo que defende tem um pouco a ver com um regresso às origens?
Bem, a indústria quer vender produtos. Por isso dá-nos a impressão que precisamos de mudar, reforçar ou imitar a natureza. Seria muito mais fácil e seguro deixar a natureza como está e apenas recuperar nas partes onde não conseguimos lidar nós próprios, mas isso tem mais a ver com tratamentos médicos e não manipulação sintética da pele.

Existem áreas em que evoluímos?
(Risos) Bem, podemos, por exemplo, tratar infecções ou ter cirurgias se partirmos os ossos…

Mas esse é o lado mais médico. E na cosmética?
Nada (risos). Talvez os protectores solares. São uma boa forma de proteger das rugas, envelhecimento e cancro da pele. Mas desenvolvemos cancro da pele mais hoje do que antes, porque o nosso comportamento mudou. Antigamente, estávamos no exterior o dia inteiro, evitávamos o sol mais forte e conseguíamos construir as nossas próprias barreiras protectoras – como o engrossamento da pele e a pigmentação, que prolonga o tempo que conseguimos estar ao sol sem efeitos. Hoje quando vamos à praia não temos preparação, por isso precisamos do creme. É uma boa invenção, mas é, mais uma vez, uma invenção para tratar um comportamento alterado.

No livro compara as borbulhas a vulcões. Há uma comunidade no Youtube de pessoas que vêem vídeos de dermatologistas a tratar borbulhas e quistos. A que se deve este fascínio?
Eu e as minhas assistentes adoramos este procedimento, porque tem um efeito e alívio imediato no paciente. É incrível para um médico ter um resultado imediato. Os psicanalistas explicariam de forma diferente: comparariam a um orgasmo.