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Será que a “síndroma das falsas esperanças” nos dificulta a vida?
A “síndroma das falsas esperanças” é uma tendência para ter crenças irrealistas sobre o que é necessário para alterar o comportamento.
Durante anos, sempre que Vik Kapoor falava em público, a barriga contorcia-se de ansiedade, o coração disparava e ele chegava ao fim de todas as aulas ensopado em suor.
“O meu medo de falar em público afectava a minha autoconfiança e por isso decidi que a minha resolução de ano novo ia ser lidar com este problema”, diz Kapoor, um life coach e professor adjunto na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard. “No início, tentei diminuir o medo procurando soluções simples. Jurei que ia vestir-me de preto sempre que falasse em público para esconder as manchas de suor e marquei uma consulta para saber se a minha ansiedade era causada por algum problema de saúde. Também decidi tornar-me a minha própria claque e fazer discursos motivadores a mim mesmo antes de cada aula.”
Depois de pensar nestas soluções, Kapoor sentiu-se melhor. Mas, na vez seguinte em que falou em público, os planos falharam. “Assim que comecei a falar, o meu estômago contorceu-se e comecei a transpirar. Tive uma branca.”
Kapoor ficou tão frustrado que se livrou da resolução de ano novo.
Naquela altura não sabia, mas agora Kapoor apercebe-se de que sofria de “síndroma das falsas esperanças”, uma tendência para ter crenças irrealistas sobre o que é necessário para alterar o comportamento.
Janet Polivy e C. Peter Herman, professores da Universidade de Toronto, cunharam este termo em 2000, com base na sua investigação que demonstrou que as pessoas subestimam frequentemente o trabalho que é necessário para atingir objectivos de auto-superação. Quando as esperanças dão de caras com a realidade, muitas vezes, o compromisso para mudar colapsa.
Vários outros cientistas acreditam que a síndroma das falsas esperanças ajuda a explicar por que razão as pessoas têm dificuldade em perder peso, deixar de fumar e fazer exercício com regularidade.
Cerca de 25% dos americanos que tomam resoluções de ano novo abandonam-nas no prazo de uma semana, de acordo com o site de estatísticas StatisticsBrain.com – quer esta resolução seja começar a dieta paleo, inscrever-se num desafio diário de ioga ou começar a praticar meditação. Em Fevereiro, a maioria das pessoas já desistiu completamente das resoluções.
Sasha Albani, psicoterapeuta e terapeuta conjugal e familiar em São Francisco, diz que a chave para não desistir de uma resolução é certificarmo-nos de que ela se alinha com os nossos valores pessoais.
“É mais provável seguirmos os nossos objectivos até ao fim quando tomamos decisões guiadas por valores. Por exemplo, se dermos valor aos benefícios para a saúde física e mental do exercício, temos mais probabilidade de sucesso ao começarmos um novo programa de exercício”, afirma.
Albani diz que é mais difícil atingir os nossos objectivos quando os nossos valores entram em conflito. “Por exemplo, imaginemos que quer deixar de beber café e refrigerantes, mas dá muito valor à maneira como a cafeína o faz sentir desperto. Neste caso, vai ser mais difícil alterar o comportamento.”
Uma teoria sobre a alteração de comportamentos conhecida como a terapia da aceitação e do compromisso, ou ACT, pode ajudar algumas pessoas a não abandonar as suas resoluções.
De acordo com a Associação de Psicologia Americana, a terapia ACT pode funcionar particularmente bem quando queremos alterar um mau hábito mas não temos a certeza dos obstáculos que podem surgir.
Este tipo de intervenção psicológica pode ajudar a aumentar a flexibilidade cognitiva ao mostrar às pessoas como identificar os seus valores e os passos que precisam de seguir para mudarem de comportamento.
“A terapia ACT divide o estabelecimento de objectivos em três passos, usando com princípios orientadores os valores, o compromisso e a vontade de mudar”, explica Daniela Tempesta, uma psicoterapeuta e life coach de São Francisco.
De acordo com Tempesta, estes são os componentes psicológicos necessários para atingir os seus novos objectivos.
Depois de vários anos sem conseguir cumprir as suas resoluções, Kapoor entrou em contacto com uma psicoterapeuta de ACT. Aprendeu rapidamente que, embora desse valor a falar com confiança, não dava valor a si mesmo. Quando tinha tentado fazer pequenos discursos de automotivação, falava consigo próprio de maneira agressiva.
“Dizia para comigo: 'Toda a gente consegue fazer isto, é fácil, controla-te.' Apercebi-me de que isto era um diálogo interno negativo e não um discurso de motivação”, conta Kapoor.
Com a ajuda do terapeuta, aprendeu a aplicar a ACT de uma maneira a colocá-lo no caminho do sucesso. “Percebi que o meu medo de falar em público derivava de uma preocupação profunda por não confiar em mim. A minha ansiedade era a forma como o meu corpo activava a resposta 'lutar ou fugir'. Assim que identifiquei esta conclusão, tive de examinar por que é que não tinha confiança nas minhas capacidades”, afirma Kapoor.
Tempesta sugere às pessoas que fazem resoluções que analisem as mudanças que pretendem e que pensem em maneiras de elas serem atingidas. Ela recomenda estes princípios ACT:
- Examine barreiras: se voltou a jurar que vai fazer uma maratona ou perder peso, pergunte a si mesmo quais foram os obstáculos que o impediram no passado. O que vai fazer desta vez para aumentar a probabilidade de sucesso? Por exemplo, se começar o treino para a maratona a correr de manhã, apesar de não ser madrugador, pode decidir treinar noutro momento do dia.
- Clarifique valores: as resoluções costumam reflectir os valores da pessoa, mas podem competir com outros valores. Por exemplo, se quer perder peso, mas a comida é a sua única forma de lidar com o stress, pode querer pensar se há outras maneiras de o ajudar a controlá-lo. Pode decidir adoptar um animal de estimação ou começar a ir a uma aula de ioga uma vez por semana. Tempesta diz que se encontrar uma maneira de alinhar os seus valores (gerir o stress e comer de forma mais saudável) tem maior probabilidade de atingir os seus objectivos.
- Aceite as emoções: quando tiver claros quais são os seus valores, pergunte a si mesmo que sentimentos poderão surgir à medida que trabalha para atingir o seu objectivo. Por exemplo, se deixar de consumir cafeína porque ela o deixa ansioso, será que se vai sentir irritado, cansado ou deprimido? A reflexão pessoal pode ajudá-lo a pensar em mecanismos para lidar com estes sentimentos.
- Tome medidas: comprometa-se a fazer mudanças no comportamento com base nos seus valores. Por exemplo, se dá valor a comer de maneira mais saudável mas o seus colegas costumam convidá-lo para almoçar, pense em como vai evitar pedir batatas fritas em vez de salada. Pode assumir o controlo, sugerindo um restaurante com ofertas saudáveis onde não se vai sentir tentado a comer os seus hidratos de carbono preferidos.
Se tiver percalços no caminho, não desista, diz Tempesta. Basta prestar atenção aos pensamentos e sentimentos que bloqueiam o seu percurso e recomeçar. Lembre-se que, se falhar nas suas resoluções, não precisa de esperar até ao próximo dia 1 de Janeiro para reunir novas esperanças.
Juli Fraga é uma psicóloga de São Francisco e não é terapeuta de ACT.
PÚBLICO/The Washington Post