Na Time Out de 21 de Dezembro Mariana Correia de Barros nomeava os três melhores sítios para comer bolo-rei na grande Lisboa: o do Careca, no Restelo, o da Confeitaria Nacional, na Praça da Ribeira, e o da Pastelaria Garrett, no Estoril.

O bolo-rei da Pastelaria Restelo (“o Careca”), que é realmente generoso com os pinhões, as nozes e as amêndoas, ganhou na prova cega de bolos-rei que a Time Out fez em 2014. Tem também a vantagem de ser o mais barato dos três, a 19 euros por quilo.

Há outra coisa em que, não sei porquê, o Careca é justamente famoso: é o fiambre. Escolhem-no, curam-no, guardam-no e cortam-no com tal perícia que é irresistível. Nem tão-pouco se paga mais por isso. O único tributo que se paga é esperar um bocadinho, já que o Careca não é nenhum segredo. Aproveite a oportunidade para provar um croissant, um palmier e um duchesse. Se ficar só por um considere-se sem pecado e pronto para o reino dos céus.

Atendendo às calças e perninhas nuas dos betinhos que lá param, a Confeitaria, o Careca e a Garrett constituem um Triângulo das Bermudas, com bicos na Baixa, no Restelo e na Avenida de Nice, no Estoril.

Este ano não provei o bolo-rei do Careca mas dizem-me fontes seguras que continua inabalável. Sabe-se que os bolos-rei mudam todos os dias e todos os anos. A qualidade depende muito da rotatividade e da frescura: quanto mais perto da hora que saiu do forno, melhor.

As palavras mágicas são “sempre a sair”. É o que acontece nas três pastelarias citadas. Esperar por nova fornada vale sempre a pena.

Este ano tenho de dizer que o bolo-rei da Confeitaria Nacional desiludiu. Comparado com a glória amarelinha, fofa e frutada que costuma alcançar, o bolo deste ano era maçudo, seco e pálido. Espero que o azar tenha sido meu. O pior seria terem mexido na receita. Não posso crer que seja verdade. Os proprietários e o pessoal da Confeitaria Nacional são sábios, simpáticos e inteligentes de mais para caírem numa asneira dessas.

Hei-de comprar outro bolo-rei da Confeitaria Nacional antes da Páscoa e aqui darei notícia se o azar foi temporário ou se devemos começar a falar em luto nacional.

O bolo-rei da Pastelaria Garrett continua magnífico. É um bolo-rei muito bem julgado, lourinho de feições e levezinho de massa, que, por não pesar nem enjoar, marcha um bolo inteiro de cada vez. Alguma vez ouviu falar em torrar o bolo-rei da Garrett ou em dar-lhe um apertão no forno? Pois, eu também não. É que ele nunca chega a ser posto de lado. É comido de uma assentada, sem se falar mais no assunto.

Por preguiça, caí na asneira de comprar vários bolos-rei em pastelarias que só fazem bolo-rei porque os clientes forçam-nas a tentar a sorte. Estes bolos-rei normais estão piores do que nunca, com má fruta, mal cristalizada, frutos secos de má qualidade, forretas e mal espalhados e massas doces e secas de mais. É um desperdício de dinheiro e de calorias.

Para refazer o triângulo nomeio o bolo-rei da Pastelaria Ribeiro da Parede. Assombrosamente, continua tão boa como há 50 anos. Os tempos mudaram mas a Pastelaria Ribeiro fez questão de não se adaptar às facilidades.

O bolo-rei da Ribeiro é sumptuosamente tradicional. O da Garrett é fininho e quase estaladiço. O da Ribeiro é alto e fofo, feito nuvem de passas perfeitamente encharcadas, sem as manchas grosseiras de açúcar branco com que é mania poupar uns cêntimos.

São dois estilos diferentes, ambos imprescindíveis. Mas cuidado: são bons de mais para comparações. A única coisa a fazer é comprar um de cada vez, comê-lo todo e fazer apontamentos.

Nem pense, caso more em Lisboa, fazer um raid na linha de Cascais, passando no Restelo, na Parede e no Estoril, para arrebatar os três bolos-rei. Terá de fazer uma só incursão de cada vez, desculpe lá. Nem é só por uma questão de respeito: é uma questão de barriga.

E no caso de me perguntar se não acho estranho não haver nenhum bolo-rei de Lisboa a que não se chegue pela linha ferroviária Cais do Sodré-Cascais, claro que acho. É só por minha triste e inaceitável ignorância. Mas lá que são excelentes estes três bolos da Linha… ah, isso é absolutamente irrefutável.

Pastelaria Ribeiro
Avenida da República, 1317
2779-501 Parede
Tel.: 214 571 100