Enric Vives-Rubio

Sargos, douradas e robalos: agora é que é altura de abarbatá-los

Estando de cabeça perdida são mais fáceis de pescar. E ainda bem, porque é nesta época que os robalos estão bons e baratos. As ovas de robalo são as melhores de qualquer peixe e os cachaços e lombos dos robalos, estando cheios de gordura, estão cheios do sabor do robalo.
 
Havendo abundância de robalos o preço deles desce e, nos restaurantes decentes, que são cada vez menos, o preço por quilo do robalo também desce para 30 euros ou menos.
 
Um robalo de 800 gramas dá lindamente para duas pessoas, ficando cada uma com meio robalo por apenas 12 euros. Só agora no Inverno é que o robalo (e o sargo e a dourada) justificam o preço que custam.
 
Comê-los no Verão, grelhados, é um disparate. Haviam de deixar os robalos todos no mar para deixá-los crescer e podermos comê-los no Inverno, grandes e gordos.
 
O robalo no pico da qualidade deve comer-se cozido. A carne sai às lascas e a gelatina é uma iguaria que pode levar às lágrimas.
 
A prova é que falo como pessoa que, desgraçadamente, não gosta de robalo. O meu pai dizia que era o peixe para quem não gosta de peixe e eu dou-lhe razão. Durante o resto do ano não sabe a nada. Grelhado e caramelizado fica com sabor a...grelhado e caramelizado. Acrescentam-lhe manteiga porque precisa de qualquer sabor.
 
Os robalos de viveiro são diferentes. São muito frescos e têm gordura. Mas o sabor deles  é de um peixe diferente, de um robalídeo distante. Há viveiros repugnantes e outros cuidadosos. Pensar que todos os robalos de viveiro são iguais é um grande erro.
 
Peça para ver as caixas de esferovite onde são embalados os robalos e depois faça uma busca online. Não ligue ao aspecto: são engendrados para serem bonitos. O que importa é a alimentação, a higiene dos tanques e a quantidade de antibióticos que lhes dão.
 
Os peixes de mar estão em trágico declínio, já não sendo possível invertê-lo, mas ainda há
robalos de mar para os próximos anos. Antes que o decurso das gerações apague o sabor e a textura do robalo selvagem da nossa memória gustativa, o melhor que temos a fazer é levar as crianças a comer os peixes e mariscos da nossa costa, para que saibam o que vão perder e prossigam os (poucos) esforços que se fazem para que sobrevivam mais uns anos.
 
Uma criança habituada a robalos de viveiro quando come robalo de mar pela primeira vez diz, se for fresquinho e grelhado ou cozido com perícia e simplicidade, que não sabe a nada. Tinha medo que soubesse muito "a peixe" e fica assim, aliviado, que afinal não saiba a nada.
 
Mas basta insistir que continue a comer e a criança dará logo pelo sabor delicado do peixe. É a leveza do sabor que impressiona. Um robalo de mar cozido está para um robalo de viveiro grelhado como uma chávena de chá para uma bica queimada.
 
Ensinar (ou aprender) as diferenças entre os sabores do robalo, da dourada e do sargo é um dos grandes prazeres gastronómicos desta época.
 
O sargo é um peixe ainda mais difícil do que o robalo: só se consegue comer quando está mais gordo, que é agora. De resto é seco e insípido, uma desilusão caríssima. Levei décadas a detestar sargo, só porque nunca o tinha comido em Dezembro. Quando comecei a comê-lo no Inverno - e só no Inverno - é que percebi o que tinha perdido.
 
Já as douradas, por serem mais saborosas, deixam-se comer mesmo quando estão magras. Se quiser fazer em casa, a maneira mais fácil é tapá-las com sal grosso, por baixo e por cima e enfiá-las num forno quente durante três quartos de hora. Ficam melhores do que cozidas porque não perdem nem ganham sabor nenhum.
 
Aproveite enquanto puder - e houver. Está tudo calibrado para se perder o gosto pelo peixe selvagem do mar quando só houver peixe de viveiro para comer.
 
Falta pouco - mas ainda falta. E ainda podemos, devemos aproveitar.