Mitos que comemos
Como prefere ser enganado?
Provavelmente não há nenhuma área onde tanto se aproveite da ignorância alheia como na saúde em geral e na nutrição em particular.
Provavelmente não há nenhuma área onde tanto se aproveite da ignorância alheia como na saúde em geral e na nutrição em particular. Detectar os peritos em pseudo-ciência não é tarefa fácil, mas existem alguns requisitos que quando cumpridos nos podem ajudar a identificar quer falsos profissionais, quer profissionais falsos (a obtenção de uma licenciatura não é infelizmente sinónimo de competência em muitos casos).
Por isso, estes “peritos” são geralmente pessoas que “nunca se enganam e raramente têm dúvidas”, até porque a “sua verdade” está sempre consubstanciada em fontes científicas tão credíveis como o Google, Facebook, YouTube e media generalistas. Na eventualidade destes peritos estarem ligados à comercialização de suplementos alimentares, possuem igualmente uma “narrativa” muito bem ensinada. Desde “os alimentos de hoje que não têm nada a ver com os dos nossos avós” a “ninguém tem vida para comer cinco porções diárias de hortofrutícolas” como pretexto para a toma de multivitamínicos, a produtos milagrosos que foram desenvolvidos por “cientistas da NASA” ou por um “prémio Nobel da Química/Medicina” para os revestir de credibilidade. Tudo serve quando o objectivo é ganhar dinheiro à custa da ignorância alheia.
Um dos vários pontos positivos do estudo e procura constante do conhecimento é tornar o indivíduo consciente de que o que realmente sabe sobre um determinado assunto é e será sempre pouco e como tal a sua postura terá sempre de ser humilde e ponderada. Neste âmbito, ouvir do seu profissional de saúde respostas como “não sei”, “depende”, ou “vou estudar mais sobre o assunto”, não são sinónimo de impreparação para o cargo mas sim de inteligência, até porque se quiser saber verdades absolutas pode sempre consultar os peritos acima descritos. Uma área em constante desenvolvimento como as ciências da nutrição exige que todos os seus profissionais possuam a mente aberta para novas ideias e conceitos, mas não tão aberta ao ponto de lhes cair o cérebro, até porque a ciência evolui, mas nem tudo o que é novo é ciência.
Assim, para concretizar algumas das experiências pelas quais não deveria passar, fica em seguida um pequeno guia de bolso para não ser enganado:
Desconfie se…
- lhe for proposta uma consulta de nutrição “gratuita” de 15 minutos mas tiver de pagar (e bem) muitos suplementos que lhe são impingidos na mesma;
- fizer um teste de intolerância alimentar e descobrir passados muitos anos que é intolerante a um sem número de alimentos que outrora nunca lhe causaram nenhum sintoma (com outros procedimentos como a ressonância magnética quântica a conversa é a mesma);
- vir publicidade a um qualquer suplemento alimentar na televisão (até porque não são os suplementos de cálcio que lhe vão diminuir o risco de fractura e nem este, nem os suplementos de café verde – que até possuem uma curiosa história – o vão emagrecer);
- tiver de comprar um determinado suplemento na ervanária ou loja de produtos naturais ou homeopáticos (há uma grande hipótese de muitos deles não possuírem os constituintes alegados no rótulo… quando têm rótulo);
- lhe fizerem demonstrações de suplementos utilizando o esferovite como um modelo da sua parede intestinal para demonstrar a sua “excelente” absorção;
- o aconselhamento alimentar que lhe foi feito foi baseado no seu signo ou se o argumento para a ingestão de sumos detox, hortaliças verdes ou suplementos de algas, for a capacidade da clorofila “oxigenar” o seu sangue (a não ser que consiga iluminar os seus intestinos e ser o único ser humano que até à data conseguiu realizar a fotossíntese).
Todas estas situações podem parecer risíveis mas fazem parte do “código de más práticas” efectuadas no nosso país, por isso, se não gosta de ser manipulado não se deixe manipular!
Nutricionista