Rui Gaudêncio

Mitos que comemos

A minha dieta é melhor que a tua

Os dias estão maiores, a hora quase a mudar e o “alerta-dieta” começa a despertar.

Os dias estão maiores, a hora quase a mudar e o “alerta-dieta” começa a despertar. Por isso, mas do que um artigo, este é um manifesto contra o fundamentalismo e crispação que nos dias de hoje rodeia a nossa alimentação. Que não se pense que a alimentação constitui caso único, uma vez que também nas questões relativas ao exercício as “rivalidades” entre vários desportos “emergentes” (corrida, trail, crossfit, zumba, musculação, treino funcional, etc.) por vezes fazem esquecer que o principal inimigo comum tem um nome e chama-se sedentarismo.

Mas, recentrando a questão na alimentação e nas suas diferentes “correntes”, um dos pontos positivos desta postura “a minha dieta é melhor que a tua”, passa indubitavelmente por uma maior valorização dos alimentos e não das calorias que lhes estão associadas. Se assumimos como certo que a partir do momento em que gastamos mais calorias do que as que consumimos estamos a emagrecer, é igualmente verdade que duas diferentes “dietas” isocalóricas (ou seja, com as mesmas calorias) não são isometabólicas (isto é, não têm o mesmo efeito no nosso metabolismo e composição corporal).

Ainda assim, uma alimentação saudável não é um destino com uma única via, existindo várias formas de lá chegar sem ser necessário hierarquizar nenhuma abordagem, até porque a melhor “dieta” é aquela com que se sente mais confortável e consequentemente consegue incorporar mais facilmente no seu estilo de vida.

Se é importante ter uma boa ingestão proteica, um moderado aporte de hidratos de carbono e uma fonte de boas gorduras em cada refeição que fazemos? Sem dúvida que sim, e o nosso apetite e massa muscular agradecem bastante, mas os são vários os alimentos que podemos escolher para o efeito. Não tem de passar a comer religiosamente aveia, batata-doce, quinoa, bagas goji ou outros alimentos da moda para ser saudável, mas se gostar de os introduzir na sua alimentação nada a opor. Do mesmo modo não tem de ser anti-glúten, anti-lacticínios, anti-carnes vermelhas, ou anti-qualquer coisa. Ou melhor pode ser anti-tabaco, anti-sedentarismo, anti-junk food e anti-fundamentalismos, até porque “fugir à dieta” ocasionalmente e sobretudo em ambiente social (amigos, família, festas) é um comportamento comprovadamente não relacionado com o ganho de peso, ao contrário do que acontece quando a restrição alimentar à qual nos auto-impomos é tanta que nos leva a “descarrilar” num contexto de isolamento. De resto, estas abordagens alimentares demasiado restritivas e potencialmente promotoras de comportamentos dicotómicos têm sabotado muitas tentativas de perda de peso.

Como tal, qualquer que seja a dieta (Mediterrânica, Paleolítico, Vegan, Macrobiótica, Hipo-glicídica/lipídica), o objectivo é o mesmo: alimentos “a sério”, pouco ou nada processados, com o mínimo de açúcar possível e com boas gorduras. Não perca demasiado tempo a lamentar-se com o facto de não conseguir ser 100% correcto nas opções alimentares que toma.

Tomando como exemplo os legumes, se não gosta de saladas coma-os cozidos ou salteados. Se não gosta nem de uma forma nem de outra, encha-se de sopa. E não se preocupe com a acção da água, da temperatura e da trituração mecânica sobre as vitaminas, porque tanto destrói algumas como torna outros compostos mais disponíveis para absorção. Mas independentemente da forma, o que interessa é que os coma! Pouco é melhor do que nada e a criação de hábitos saudáveis depende em muito destas pequenas mudanças e melhorias em coisas simples na sua alimentação.

Em suma, um estilo de vida saudável não é um cenário a preto e branco mas sim com vários tons de cinzento, por isso ao invés de fazer comparações com a dieta ou o tipo de exercício que o colega do lado faz, experimente várias abordagens alimentares, desafie-se constantemente em novos tipos de exercício e escolha aqueles em que sente melhor e nos quais verifica melhores resultados. Esse sim é o seu estilo de vida ideal.