Mitos que comemos
Dieta do Paleolítico: Está na hora de mudar o paradigma?
As dietas da moda vão e vêm. Já esta, tem uma base científica.
Dieta dos 2 e dos 31 dias, dieta do tipo sanguíneo, das calorias negativas, a simples ou a 1-2-3… Já todos estamos cansados de dietas e sem grande paciência para saber qual será a próxima dieta que resolverá todos os nossos problemas. Mas, com a dieta do Paleolítico, a coisa é ligeiramente diferente uma vez que existe de facto uma base científica que a substancia e que, não tendo ainda grande robustez, merece a nossa atenção.
Comecemos por um ponto prévio importante. Apesar de se designar “dieta do Paleolítico”, é muito provável que neste período da história não se tenha comido assim por inúmeras razões (os interessados poderão consultar este interessante artigo e esta TED Talk). Ainda assim, não é sobre as alegadas incoerências históricas desta dieta que falaremos, mas sim do que realmente interessa, ou seja, os seus efeitos na saúde.
Em breves palavras, a dieta do Paleolítico resume-se a um corte radical no consumo de lacticínios, leguminosas, cereais e todo e qualquer tipo de alimento processado. Margarinas e cremes vegetais, bolachas, cereais prontos a comer, bolos e biscoitos são autênticas heresias nesta dieta - até porque açúcar, ácidos gordos trans e mesmo o glúten são encarados como inimigos públicos. Se sobre os primeiros o consenso é geral, o caso do glúten merecerá um artigo exclusivo (e será já o próximo).
Poderá estar nesta fase a pensar se existe então algo que se possa então comer nesta dieta? Sim existe. Carne, peixe e ovos com à-vontade, bem como hortícolas, frutos gordos (particularmente nozes) e fruta em relativa moderação. Depois, dependendo do grau de compromisso em relação à “pureza” da dieta, alguns alimentos poderão ser introduzidos como aveia, mel, vinho tinto, batata-doce, azeite, entre outros.
O que nos diz a ciência sobre esta dieta? Até ver, e apesar do pequeno tamanho amostral de todos os estudos realizados, bem como da falta de grupos de controlo e escasso tempo de exposição à dieta de alguns deles, os resultados são promissores. Em diabéticos (apenas com terapia oral), a "paleodiet" diminuiu os níveis de hemoglobina A1C (o que é revelador de um melhor controlo da glicemia), triglicerídeos, pressão arterial, peso, perímetro da cintura e aumentou os níveis de bom colesterol. Ainda em diabéticos, quando comparada a dieta do Paleolítico com a “nossa” dieta mediterrânica (que, em abono da verdade, muito pouca gente pratica), verificou-se que ambas são igualmente saciantes mas que a "paleodiet" o foi com um menor número de calorias ingeridas. Mesmo indivíduos saudáveis apresentam ganhos na melhoria do perfil lipídico, controlo glicémicoe diminuição do peso e pressão arterial quando submetidos a esta dieta. Quer isto então dizer que estamos todos errados na nossa forma “tradicional” de comer? Não necessariamente! Alimentos como os lacticínios, pão, feijão e grão não necessitam de ser eliminados para conseguirmos fazer uma dieta equilibrada.
Uma das grandes vantagens da dieta do Paleolítico está uma vez mais no grande condicionamento alimentar que induz - até porque os seus praticantes são, por norma, obstinados e até algo fundamentalistas no seu cumprimento. Deste modo, mais uma vez se reforça que quer na perda de peso, quer na aquisição de hábitos alimentares adequados, mais importante do que a “dieta” assumida, está o grau de adesão à mesma e, a este nível, a exclusão quase completa de açúcares simples e gorduras trans por parte da "paleodiet" traduz-se inevitavelmente nos benefícios acima descritos.
Já quanto às desvantagens desta dieta, o cumprimento das recomendações de alguns nutrientes (particularmente o cálcio) poderá ser difícil, mas mais importante do que isso é o custo quer económico quer ambiental que este tipo de dieta poderá acarretar. A exclusão da energia e proteína barata proveniente do pão, massas, batata, arroz e leite e, sobretudo, o aumento da ingestão de carne e peixe, bem como de alguns alimentos “híbridos” como a aveia, batata-doce, frutos gordos traduzir-se-á num aumento do custo da alimentação, existindo até já quem o estimasse em cerca de 10%. Para além do mais, se a quantidade de proteína animal actualmente existente na nossa dieta acarreta já um grande impacto ambiental, será sustentável a todos os níveis aconselhar um aumento da ingestão desta mesma proteína num planeta já muito espremido nos seus recursos?
Em suma, quer pelos factos acima referidos, quer pelas tradições alimentares fortemente enraizadas num país que tem como pequeno-almoço “oficial” a torrada com a meia de leite e, nos pratos típicos, as feijoadas, os “arrozes” malandros e as batatinhas a murro, poderá ser ainda muito cedo para mudar o actual paradigma da alimentação saudável. Mas a dieta do Paleolítico diz-nos que pode haver mais vida para além da roda dos alimentos.
Em resumo:
- Se come de forma mais “tradicional” e não consegue deixar de lado o seu pãozinho, o leite e os “farináceos”, fique a saber que é igualmente possível fazer uma alimentação equilibrada nestes termos;
- Seja qual for o motivo ou a dieta, se o levar a comer menos sal, açúcar, gorduras hidrogenadas e alimentos excessivamente processados, estará sempre no bom caminho!