Mães há muitas

Educar não é ocupação de tempos livres
- Quando é que educas a tua filha?
- Nos tempos livres.
- E a miúda está acordada nessa altura?
- Às vezes deito-a mais tarde, mas não contes a ninguém.
Há dias em que me sinto uma mãe-da-noite. Qualquer comparação com uma mulher-da-noite é injusta, trabalho somente para um cliente e com objectivos relativamente altruístas. É que, na maior parte do tempo, é à noite que sou, efectivamente, mãe.
Sabemos que temos pouco tempo para educar os nossos filhos. Educação que queremos que seja brilhante, já que somos nós os pedagogos. Por isso, a dúvida que se instalou no meu cérebro maternal é saber como educar, exemplarmente, um pequeno ser humano no pouco tempo diário que me sobra. Ou seja, altura em que a expressão “educar às escuras” faz todo o sentido.
Mas será que educar é a ocupação de tempos livres dos papás? Ali, entre as 19h e as 21h há intervalo para recreio e é suposto pais e filhos brincarem. Isto se, mau-mau maria, fizerem os trabalhos de casa, antes. Entre banho e vestir pijama, entre preparar e dar o jantar, entre brincar de cu-cu e de hoje sou um canguru, entre “Não mexas aí” e “Já te avisei”, afinal, quando é que se educa? Calma, ainda sobram alguns minutos. E é aqui que – atenção! – se pode dar uma educaçãozinha rápida. É encostar a criancinha à parede e dizer-lhe umas quantas verdades educacionais.
- De manhã, antes de gritares Ma-mã!, tens de dizer Bom Dia, estamos entendidas?
- E quando o pai entra no teu quarto a saltar como um canguru, tens de te rir por delicadeza, percebes?
Refiro-me somente à educação mais visível, ou seja, as boas maneiras dos futuros adultos que lançamos ao mundo. Porque se há coisa que está em crise são os Bom-dia e Obrigado. Já a educação da mente e do coração vamos empurrando para o fim-de-semana.
O sábado e domingo são o momento alto familiar: dois dias inteirinhos juntos. Tempo mais que suficiente para uma família de três quase deixar de se falar. Porque vejo a maioria dos pais frustrados com os seus fantásticos planos de fim-de-semana. Porque não são a família feliz do anúncio de cereais. Porque não previram a quantidade de “Nãos” que tiveram de proferir, suavemente, no sábado de manhã e, ameaçadoramente, no domingo à noite. E que explica que a primeira palavra da maioria dos bebés seja “Não”. Pois seja, podemos todos viver com isso. Mas já agora, para amenizar este constrangimento verbal, podemos ensiná-las que é “Não, obrigado”.
Com tantos livros de pediatras e de ilustres pais desconhecidos não encontrei nenhum que explicasse Como educar o seu filho em 10 minutos. “Receitas rápidas dirija-se à secção de auto-ajuda ou de culinária”, disse-me o funcionário da livraria. Aqui as prateleiras estão cheias de dicas para uma adaptação aos tempos modernos. Borreguinho ensopado em 3 passos. Brócolos rápidos e no ponto. Junta-se a técnica de empratamento e uma pessoa sente que vale alguma coisa, mesmo que ao abrir a boca a coisa possa azedar. Ainda dei uma vista de olhos na secção de Gestão de Tempo, rapidamente, pois uma mãe entra numa livraria com um propósito concreto e não para fazer tempo. Mas só perdi tempo.
E é de minutos, muitos, que se trata. Os pais não têm tempo para educar os filhos. Acrescente-se: como gostariam. Educam quando dá. Como dá. Com o tempo contado, a estratégia parental é, frequentemente, educar à sua imagem. Porque quem educa num minuto não tem espaço de manobra para semear questionamentos na mente infantil. “É assim, porque sim!” E é também assim que se varre para debaixo do tapete a personalidade de um filho. Vou ali perguntar ao meu patrão se me dão uma licença com vencimento por 12 anos.