- Baz Luhrmann é conhecido pelos seus filmes visualmente extravagantes DR
- A designer de figurinos Catherine Martin preocupou-se muito com a vertente histórica do guarda-roupa do filme de Luhrmann, seu marido DR
- A actriz Mia Farrow no papel de Daisy Buchanan na versão de 1974, vestida por Theoni V. Aldredge DR
- Mia Farrow numa fotografia tirada durante a filmagem do filme de 1974 DR
- A riqueza dos detalhes em destaque neste vestido da personagem Daisy Buchanan, interpretada por Carey Mulligan DR
- A art deco de inspiração oriental foi uma das tendências que marcou a década de 1920 DR
- Carey Mulligan, no papel de Daisy, acompanhada por Leonardo DiCaprio como Jay Gatsby e o actor Joel Edgerton, que faz de seu marido no filme dr
- Mia Farrow em cena no filme de 1974 DR
- A personagem Jordan Baker, interpretada por Elizabeth Debicki na versão mais recente do filme DR
- A actriz Lois Chiles fez o papel de Jordan Baker na versão de 1974 DR
- As calças brancas de Jay Gatsby são um elemento do guarda-roupa com grande significado DR
- Robert Redford interpretou a personagem de Jay Gatsby em 1974, vestido por Ralph Lauren DR
- Tobey Maguire faz o papel de Nick Carraway, aqui acompanhado por Leonardo DiCaprio, ambos vestidos pela marca Brooks Brothers DR
- Jay Gatsby, Nick Carraway e Tom Buchanan num frame do filme de 1974, dirigido por Jack Clayton DR
- As personagens principais de O Grande Gatsby DR
- Um dos esboços criados pela designer Miuccia Prada, para o guarda-roupa do filme DR
- Um dos esboços criados pela designer Miuccia Prada, para o guarda-roupa do filme DR
- Um dos esboços criados pela designer Miuccia Prada, para o guarda-roupa do filme DR
- Um dos esboços criados pela designer Miuccia Prada, para o guarda-roupa do filme DR
Deirdre Clemente
N’O Grande Gatsby, “a roupa é classe”
Deirdre Clemente é professora no departamento de História da Universidade de Nevada, Las Vegas, e autora de uma tese sobre Clothing as Cultural History in the Work of F. Scott Fitzgerald, 1915-1925. Apaixonada pela obra de Fitzgerald, especialmente por O Grande Gatsby, foi consultora histórica do filme que esta semana abre o Festival de Cannes e que quinta-feira se estreia nas salas portuguesas. Para Clemente, a Lanvin teria sido melhor do que a Prada para este filme e tudo, mesmo a roupa, é um símbolo de classe e um elemento narrativo central na história de Jay Gatsby, Nick Carraway, Daisy e Tom Buchanan.
Baz Luhrmann é conhecido pelos seus filmes visualmente extravagantes. Será que esta abordagem ao trabalho de Fitzgerald, que tão luxuriosamente descreve as festas e os ambientes em O Grande Gatsby, é uma combinação perfeita?
Não só pela extravagância, mas porque Luhrmann não está comprometido com a imagem de Fiztgerald. Todos os alunos de liceu dos Estados Unidos lêem O Grande Gatsby nas aulas de Literatura e constroem e elevam o romance na sua memória. Luhrmann olha criticamente para os temas das classes socioeconómicas e da raça de uma forma que um realizador americano poderia ter dificuldades em fazer. O filme tem bailarinas carnudas afro-americanas e um Wolfsheim com um ar muito vindo do Médio Oriente. Não são escolhas óbvias. E sim, a extravagância!...
Como descreveria o papel da moda – e das artes decorativas – no trabalho de Fitzgerald, e especificamente em O Grande Gatsby?
Fitzgerald é um grande cronista, mais do que um metapensador, na linha de [Albert] Camus. Os detalhes do vestuário e das artes decorativas servem dois propósitos: estabelecer o ambiente de uma cena e desenvolver personagens.
O que é que isso representa e de que forma enriquece a narrativa, para além do aspecto descritivo?
No que toca ao desenvolvimento de personagens, a roupa é classe. Nestas descrições de calças brancas de flanela e chapéus cor-de-alfazema, percebemos não só os que têm e os que não têm, mas o que talvez é mais importante do que isso, a diferença entre vários tipos de “classe alta”. Os americanos gostam de pensar que “classe alta” tem a ver com quanto dinheiro se tem na conta bancária. E é muito mais do que isso. É uma questão de conhecimento de códigos sociais – não usar um fato cor-de-rosa, por exemplo.
Neste contexto, e à luz do livro e das adaptações que teve ao cinema, é especialmente importante analisar estes objectos culturais, estas peças de vestuário? Se sim, porquê?
Espero que as pessoas se lembrem que esta é uma interpretação. A precisão histórica não é um requisito para o design de figurinos a não ser que se queira que o seja. Mas posso dizer, e os espectadores verão que o realizador e a designer de figurinos Catherine Martin se preocuparam muito com o seu conhecimento de história e, depois, escolheram como a usar baseando-se na sua visão artística. Talvez o mais interessante será considerar estes objectos culturais (os figurinos do filme, a colecção da Brooks Brothers) como odes ao original, mas originais em direito próprio. Artefactos de direito.
Outra colaboração com potencial foi a de Miuccia Prada, que criou muitos dos vestidos usados por Daisy ou Jordan Baker. O que pensa desta combinação de sensibilidades de estilo?
Teria optado por uma marca da época. É por isso que a Brooks Brothers [histórica marca de alfaiataria americana] é uma escolha tão perfeita. Eles desenharam as roupas sobre as quais Fitzgerald escrevia. Penso que a Lanvin teria sido melhor. Claro que há uma relação pessoal entre o realizador e a designer, mas penso que podia ter havido escolhas melhores.
Como foi trabalhar com Catherine e Baz Luhrmann como consultora histórica do filme?
Falei especificamente com Catherine Martin sobre o significado cultural das calças brancas de Nick e sobre o significado dos tecidos no romance. Fiquei espantada com quão genuinamente interessada estava na história. Eles tinham um enorme guarda-roupa cheio de roupas vintage dos anos 1920 com o qual sonho até hoje.
Tanto Fitzgerald quanto a sua mulher, Zelda, viveram vidas cheias de experiências de sonho e muito acesso à moda. Como é que isso se traduz no trabalho de Fitzgerald, que chegou a interromper a escrita de O Grande Gatsby para viajar com Zelda para Nice para trabalharem na sua relação?
Fitzgerald era um homem que se importava com a roupa. Não era da classe alta, mas sabia o poder de se vestir à altura e o poder de uma licenciatura em Princeton. Já Zelda, era do Sul e, em 1920, Fiztgerald trouxe-a para Nova Iorque. Ele dizia que ela queria “franjas e superficialidade”. Comprou-lhe um fato [Jean] Patou. Zelda é sobrevalorizada como uma ditadora de tendências. Lembramo-la como uma flapper exuberante mas, em termos de vestuário, não era muito progressista.
Acha que a imagética, o optimismo e a exuberância dos roaring twenties de O Grande Gatsby diz algo de especial aos públicos de hoje? E que pode mesmo traduzir-se numa influência de moda actual?
Acho que os anos 1920 têm uma influência duradoura na cultura americana, porque foi quando a ideia de classe social se tornou muito mais fluida e inclusiva.
Pensa que o trabalho de Fitzgerald, seja sob que forma se traduza em objectos culturais presentes ou passados, tem um maior potencial para ter algum tipo de influência na criação de moda hoje do que outros autores ou produtos literários ou cinematográficos?
Desde a sua morte, Fitzgerald (tal como as bainhas mais descidas) tem feito aparições cíclicas na nossa cultura. Penso que esta é a mais recente encarnação, mas o melhor de tudo é que os anos 1920 voltarão em breve, daqui a 25 anos.