Dicionário dos Alimentos

S de Salmão

Serão mais saudáveis as espécies desenvolvidas em viveiro ou as selvagens?

Num mundo perfeito, para além de nos brindar com a sua esplendorosa composição nutricional, o salmão seria igualmente capaz de nos influenciar em termos de carácter. Este exemplo de obstinação animal migra do mar para o rio onde nasceu anos antes, sendo capaz de percorrer 90 km por dia contra a corrente em busca da perpetuação da espécie sendo que, após a desova, o seu destino mais provável é mesmo a morte. 

Apesar de ser um fiel peregrino dos nossos rios há anos, o salmão nunca nos suscitou aquele sentimento de pertença como o fazem outros peixes, como a sardinha e o bacalhau. É pena, pois o salmão é daqueles alimentos que encaixa como uma luva nas necessidades de miúdos e graúdos com a vantagem de estar disponível o ano inteiro. A este respeito, o salmão é um caso que traz sempre à ribalta a discussão em torno do peixe selvagem versus peixe de aquacultura ou de “viveiro”. Estando a época da captura do salmão confinada a cinco meses (Março a Julho) e o seu consumo a aumentar cada vez mais, é natural (e saudável do ponto de vista da sustentabilidade) que a sua produção em viveiro seja uma necessidade cada vez maior. Se ao nível sensorial existem sempre apreciadores que não se deixam “enganar”, no que diz respeito à composição nutricional o salmão de aquacultura ostenta a vantagem de possuir níveis de gordura mais estáveis, não estando estes dependentes das variações sazonais que caracteriza a composição do salmão selvagem. Para além do mais, estando em viveiro, o salmão não entra nas grandes “correrias” que faz no seu habitat natural, o que faz com que o seu teor de gordura seja até superior ao das espécies selvagens. Ainda assim, a proporção de ómega 3/ómega-6 é favorável àquele que cresce nos rios, em liberdade.

Toda esta preocupação com a quantidade de gordura do salmão está, logicamente, associada aos benefícios que os ácidos gordos ómega 3 nos trazem e que começam a ser fundamentais quando ainda estamos dentro do útero da nossa mãe no desenvolvimento do cérebro e retina, até ao envelhecimento, reduzindo o risco de declínio cognitivo, demência e doença de Alzheimer. Pelo meio diminui ainda o risco de depressão, reforça o sistema imunitário e melhora inúmeros marcadores de risco cardiovascular como triglicerídeos e pressão arterial. Mas o maior erro que podemos cometer é confinar os benefícios do salmão à quantidade de ómega 3. O salmão é muito mais do que isso, é vitamina A, D, E e B12, é cálcio, selénio e fósforo, e é sobretudo um peixe que dá vontade de comer!

Será sempre mais fácil convencer uma criança a comer um filete de salmão, com a sua exuberante cor e sem espinhas metidas “ao barulho”, do que sardinha e outros peixes “gordos” que são igualmente fontes de excelência de todos estes nutrientes necessários ao seu correcto crescimento e desenvolvimento. Para os mais velhos, seja ao embalo da nova tendência do sushi ou à antiga, grelhado com alecrim e batata a murro, o mais importante será o seu consumo de modo natural, pois fumar o salmão é atentar contra muitos dos seus benefícios.

 

Assistente Convidado da Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto
pedrocarvalho@fcna.up.pt