As telas de João Carlos
Tirar fotografias a rostos maquilhados é um exercício de estética. O trunfo deste fotógrafo de nome português - mas americano de nacionalidade - é o jogo de luz e a pós-produção. O Life&Style mostra em exclusivo uma das histórias deste Hasselblad Master e desvenda o que é preciso para tornar uns lábios pintados em “fine art”.
Não é pintor mas podia ter sido. O pincel de João Carlos é a lente da sua câmara de filmar e valeu-lhe, em 2009, um dos mais prestigiados prémios da fotografia, o Hasselblad Master. Cartier Bresson e Sebastião Salgado também o receberam. Tem uma obra nas áreas da moda e da beleza e define-a como fine art devido ao trabalho de pós-produção que impõe às suas imagens. “Do que gosto na moda é da liberdade de criar conceitos e histórias. Sou autor. São peças para fazer grandes ampliações e estarem na parede.” E aqui, a pós-pródução é essencial. “Toda a minha fotografia é muito pós-produzida, excepto o trabalho de ‘autor’, como foi o caso de uma série de fotografias sobre o circo, que é um trabalho de luz em que fotografei sempre com a mesma lente”, conta.
Na moda e na beleza, não é possível limitarmo-nos a clicar no botão. Como noutro trabalho fotográfico, há que criar personagens, dar-lhes vida, uma dinâmica própria e contar uma história. Foi este método que lhe valeu o prémio Hasselblad Master com fotografias de moda, na categoria de wedding-social. Anualmente concorrem em média três mil fotógrafos para que dez sejam reconhecidos com o título de Hasselblad Master. Como é que João Carlos conseguiu ser um deles? Pensou em histórias de amor – ou tragédias – e interpretou-as; Romeu e Julieta, Sansão e Dalila, Pedro e Inês, e fotografou em cenários portugueses.”É o local que cria o mood e outras dimensões de inspiração”, defende.
The beggining em Nova Iorque
Aos quatro anos, conta o fotógrafo que nasceu em Nova Iorque, as paredes de casa foram a sua primeira tela. “Tínhamos um corredor estreito e comprido com paredes brancas que pintei várias vezes. Os meus pais ralhavam, apagavam e eu voltava a desenhar. Depois passei a pintar o interior das portas do roupeiro do meu quarto, e essas ainda hoje continuam lá.”
Há pouco tempo, a mãe contou-lhe uma história de que não se lembrava: “A primeira prenda de Natal que pedi foi uma máquina fotográfica. Ela ofereceu uma câmara de brinquedo. “Agradeci, devolvi a câmara e disse que queria uma verdadeira porque aquela não tinha flash. Sempre tive o bichinho.” Quis ser ilustrador de banda desenhada e também se lembrou de ser designer de carros de corrida mas, aos 12 anos, começou a ajudar a irmã, dez anos mais velha, que estudava moda no Berkeley College em Nova Iorque e não tinha jeito para desenhar. Quando veio para Portugal, entrou na Ar.Co e estudou pintura e escultura. Um acidente de percurso com um professor de pintura levou-o à fotografia – aos 15 anos expôs na Bienal de Cerveira uma fotografia tirada no Museum of Modern Art de Nova Iorque.
Assume-se como um fotógrafo de pessoas. Estagiou com João Palmeira e diz que foi a sua grande escola. “Lembro-me que no primeiro dia de trabalho fazia-se a campanha da Lipton e havia neve no estúdio e grandes décors. Percebi que era aquilo que queria fazer”. “ Sou criador de imagens. Às vezes observo e outras vezes crio. Sempre tive um grande poder de observação. Vivo da fotografia há 12 anos. Tenho prémios que trazem reconhecimento e tudo isso são degraus que se vão subindo”, explica João Carlos, que ficou em Portugal por causa de uma namorada. Agora, o seu poiso fixo é Nova Iorque.
Tem no portfólio nomes sonantes, como as revistas Forbes e Wallpaper, mas afirma que só quando conseguir um billboard em Times Square saberá que está no caminho certo. "Foi difícil começar num meio tão competitivo e adverso. É um mercado muito fechado". Ainda assim, traça como próxima etapa um meio tão ou mais competitivo: o cinema.
Lábios, olhos, pele, cabelos. De um rosto podem fazer-se quatro ou mais fotografias, e todas elas distintas, diz João Carlos. "O mais difícil de fotografar em beleza são os cabelos. As marcas que vendem produtos de cabelo querem-no perfeito ao ponto em que até deixa de ser real. Criar uns caracóis lindos ou um cabelo ondulado com vento é muito difícil", diz.
Fotografia de beleza, explica, não é só retratar lábios e olhos pintados. "É ser super criativo, mostrar a cor e dar-lhe dinâmica; é uma pele bonita, limpa e saudável". E a pós-produção é essencial, reforça.
A história do trabalho que o Life&Style publica está na luz e nas sombras e foi feito durante um workshop que deu em Toronto, no Canadá. Neste trabalho podemos ver a forma como trabalha a luz e a usa para dinamizar um tema à partida estático: um rosto maquilhado.
O fotógrafo aconselha quem está a começar a trabalhar com luz a não utilizar muita iluminação artificial. “O que é preciso é colocá-la no sítio certo, perceber que, num plano escuro, um pouco de cor nos lábios é o suficiente para criar uma imagem interessante. Acaba por ser um exercício de estética também”. “Um fotógrafo não se pode limitar ao que vê à sua frente, até porque tem o poder de transformar. É como costumo dizer: think outside of the box”, diz João Carlos.
http://www.joaocarlosphoto.com/
Ficha técnica:Fotografia
Joao Carlos
Assistido por Mark Bianco
Maquilhagem
Olivia Ha
Irene Sy
Pós-edição
Gina Hernandez
Styling
Sarah Kates
Modelos
Alex (Cornerstone Models)
Ally Armstong (Shok Models)
Rachel Tabo (Velocci)
Alayna Kellet (Shok Models)
Kristina Kottova (Shok Models)