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Jardinagem

Merujes na sua sopa ou salada

Embora conhecida e apreciada pelas populações locais, a planta silvestre merujes tem tido uma utilização limitada

Na zona Norte do país, em particular a norte do rio Mondego, é comum encontrar-se nas margens dos ribeiros e regatos, ou em terrenos inundados, uma pequena planta silvestre vulgarmente designada como merujes que forma tapetes mais ou menos extensos. Outras designações são também utilizadas como merujinha, marujunha ou morugem, dependendo dos locais onde a planta se encontra. Embora conhecida e apreciada pelas populações locais, a espécie tem tido uma utilização limitada. Devido às reduzidas dimensões da planta e às suas flores diminutas, só um olho bem treinado a consegue identificar no meio de outras também comuns nestes habitats. No entanto, a sua utilização em saladas e em sopas, um pouco à semelhança do que se verifica com outras espécies, como a beldroega, é comum. 


A planta 
A espécie merujes é cientificamente designada Montia fontana, sendo reconhecidas pelo menos três subespécies: fontanachondrosperma e amporitana. A taxonomia da planta é um assunto polémico na comunidade científica em virtude de o seu aspecto variar muito com as condições ambientais, o que torna por vezes difícil a sua identificação. À semelhança da planta, as flores são diminutas, o mesmo acontecendo com as sementes, de cor escura. A planta é anual ou vivaz, com a floração a ocorrer nos meses de Junho a Setembro, podendo as sementes (normalmente três por fruto) ser recolhidas em Outubro. O crescimento vegetativo verifica-se principalmente de Janeiro a Março, altura em que as folhas devem ser obtidas. O seu ciclo de vida é anual e a planta pode atingir cerca de 0,5m. As flores, com cinco pétalas brancas, são hermafroditas e a polinização é realizada por insectos, sendo a espécie auto-fértil, o que significa que o pólen de uma flor pode polinizar a parte feminina da mesma flor. Em virtude desta situação, as populações tendem a ser muito uniformes. É uma espécie muito comum nas regiões temperadas do hemisfério Norte, embora possa também ser encontrada em algumas zonas tropicais e em latitudes elevadas, próximo do círculo polar Árctico. Os caules rasteiros formam facilmente raízes adventícias que permitem uma colonização rápida de novos espaços.

Obter e propagar merujes
Como já foi referido, os merujes podem reproduzir-se por sementes. Estas devem ser retiradas dos frutos (cápsulas) quando estes ainda estão fechados. Tanto quanto é do nosso conhecimento, não existem sementes à venda, pelo que se pretende obter sementes deve estar atento ao aparecimento das flores e subsequente formação do fruto e das sementes, processos que são relativamente rápidos e que levam cerca de dois meses nesta espécie. Depois de obter um número considerável de sementes, estas devem sofrer um tratamento pelo frio durante algum tempo para facilitar a germinação. Pode guardar as sementes no frio durante alguns dias e depois proceder à sementeira. As sementes não requerem condições particulares de germinação, podendo ser usada uma mistura de areia e terra de jardim em proporções iguais. O solo deve estar bem embebido pois trata-se de uma hidrófita, ou seja, uma planta que vive em locais com grande quantidade de água disponível. Em alternativa, pode desinfectar as sementes com lixívia comercial, lavá-las duas ou três vezes em água para tirar o excesso de lixívia e colocar a germinar em copos de plástico com uma camada de algodão hidrófilo coberta com papel absorvente. Depois de humedecer o algodão, coloque as sementes e deixe a germinar num local com uma temperatura à volta de 20 ºC. As taxas de germinação rondam os 100% e a germinação é relativamente rápida (uma a duas semanas). As plântulas assim obtidas podem depois ser transferidas para solo conforme acima referido. Em alternativa, pode recolher plantas no campo e proceder à sua multiplicação por clonagem. Para isso, deve seccionar o caule em fragmentos com cerca de 4-6cm e colocar sobre solo húmido. Pressionar ligeiramente o caule contra o solo de maneira a enterrar ligeiramente algumas zonas do caule. Nesse locais a planta formará raízes e o caule continuará o seu desenvolvimento normal. Podem usar-se tabuleiros de plástico, que devem ser mantidos em locais iluminados e a temperaturas da ordem dos 18-20º C. Se quiser brincar um pouco à clonagem pode também colocar os segmentos do caule em água (num tabuleiro ou alguidar) e verificar que, também nestas condições, a planta consegue crescer. Neste caso, as plantas obtidas serão todas iguais à planta de onde retirou os segmentos, enquanto na multiplicação por sementes as plantas terão características diferentes. Nas culturas em água esta deve ser periodicamente mudada para evitar a acumulação de compostos ou de microrganismos prejudiciais. Dadas as características da planta, a cultura em hidroponia pode ser um método eficaz de propagação da planta em larga escala.

Como utilizar
As folhas e os caules de merujes são tenros e de saber agradável, podendo ser consumidos em fresco, na preparação de saladas ou utilizados na confecção de sopas, um pouco à semelhança das beldroegas. A planta possui elevados teores de vitamina C, ácidos gordos ómega 3 e fibras, para além de vários elementos minerais. Em algumas populações, o teor de ácido oxálico pode ser elevado, podendo essa situação reflectir-se num sabor menos apelativo. O consumo em fresco requer alguns cuidados especiais que têm a ver com uma boa lavagem e com o local de colheita. Quando se procede à colheita de plantas silvestres, estas devem ser retiradas de locais não poluídos, devendo evitar-se ribeiros com caudal reduzido ou águas estagnadas. As plantas a utilizar podem ser colocadas numa solução de vinagre e limão durante algum tempo, seguida de lavagem em água corrente. Agora só falta ir ao campo, tentar encontrar os merujes e começar a utilizá-los na sua alimentação. Boa sorte!

Biólogo e da Associação Portuguesa de Horticultura