Miguel Madeira

Compras

É possível fazer uma alimentação equilibrada com 27 euros por semana?

Gwyneth Paltrow tentou mas desistiu. O Life&Style pediu a uma nutricionista para experimentar.

As senhas de refeição (food stamps) criadas em 1939 nos EUA e distribuídas mensalmente a 47 milhões de norte-americanos fizeram esta semana manchetes um pouco por todo o mundo: a actriz Gwyneth Paltrow tentou viver com o valor semanal previsto (29 dólares, o equivalente a 27 euros) mas desistiu ao quarto dia.

“A realidade americana é sem dúvida diferente da nossa”, considera a nutricionista Lillian Barros, autora do livro Sumos e Águas Detox (Esfera dos Livros, 2014). “Os nossos 27 euros podem significar bem menos por aquelas bandas. Mas a realidade e a causa abandonada pela actriz, mais do que uma escolha, parece-me ser um sinal de alerta para uma realidade que muitos desconhecem nas sociedades ditas evoluídas em que o excesso alimentar e a pobreza vivem lado a lado”, defende.

Apesar de em Portugal não existir uma política de senhas de comida, há muitas famílias com baixos rendimentos e dificuldade em conciliar um diminuto orçamento familiar e uma alimentação saudável. A actriz norte-americana, na sua ida ao supermercado, comprou uma dúzia de ovos, sete limas, tomate, alho, arroz integral, feijão preto, ervilhas, cebola, uma batata, milho, alface e outros vegetais. Lillian Barros também foi ao supermercado e conseguiu comprar muito mais do que Paltrow.

“Com 27 euros, apesar de uma alimentação um pouco monótona, é possível alimentarmo-nos com os ingredientes essenciais que nos fornecem todos os macronutrientes para exercer as nossa funções vitais e manter o equilíbrio do nosso organismo”, defende a nutricionista.

Assim, na sua ida às compras ao hipermercado Continente (do grupo Soane a que pertence também o PÚBLICO), Lillian Barros saiu com um carrinho cheio e ultrapassou o valor em apenas 15 cêntimos. “Hoje em dia fala-se muito em alimentos biológicos, super alimentos e ingredientes funcionais que fazem disparar o valor do orçamento familiar mas é possível comer bem e barato. Existem bons alimentos do ponto de vista nutricional que ainda mantêm um custo acessível”, diz, lembrando a necessidade de escolher “alimentos da época, de preferência de produção nacional e aderir às promoções e marcas próprias”. No fim, a nutricionista levou para casa:

- Flocos de Aveia Fina (emb. 400 gr) 0,80 euros
- Iogurte Magro Aroma Ananás/Manga Continente Equilíbrio (emb.6 x 125 gr) 1,40 euros
- Ovos Classe L (12 un) 1,85 euros
- Arroz Integral Extra Longo Área Viva (1 kg) 1,00 euro
- Batata Doce (1kg) 1,60 euros
- Cenoura Embalada (emb. 1 kg) 0,47 euros
- Frango do Campo Inteiro com Miúdos Selecção (1 un = 2500 kg) 8,73 euros
- Tomate Chucha (1kg) 1,99 euros
- Azeite É (emb. 1 lt) 2,69 euros
- Pera Rocha Calibre 65/75 (1kg) 0,99 euros
- Alface Frisada (1 un = 400 gr) 1,11 euros
- Alho Francês (1kg) 1,49 euros
- Cebola Continente (emb. 1,5 kg) 1,09 euros
- Beterraba sem Rama (1 un = 270 gr) 0,38 euros
- Nabo sem Rama (1 un = 290 gr) 0,43 euros
- Limão Cal. 2/3 (3 unidades) 0,67 euros
- Couve Brócolo (1 un = 270 gr) 0,46 euros

É uma lista de produtos simples, explica a nutricionista, onde não constam alimentos processados e a maioria é de origem vegetal, o que garante uma “alimentação mesmo assim variada em termos nutricionais, incluindo as porções de hidratos de carbono, fibra alimentar, vitaminas, minerais, ácidos gordos essenciais e proteínas de alto valor biológico”.

Na óptica da especialista, em Portugal, o que encarece a lista de compras são os snacks, guloseimas, doces, chocolates, alimentos processados e pré-preparados. Estes são “maioritariamente de má qualidade nutricional, com açúcares de adição, farinhas refinadas, gorduras saturadas, trans e excessos calóricos”, explica.

“Pensando bem, uma alimentação genuína acaba por não ser assim tão mais cara”, diz Lillian Barros. Como poderíamos, então, transformar esta lista de compras em refeições?

Começando pelos pequenos-almoços, Lillian sugere utilizar o iogurte e misturá-lo com aveia e fruta fresca. Para iniciar as refeições principais, os ingredientes comprados conseguem fazer “sopas de legumes variadas” com alho francês, brócolos, cenoura, nabo e beterraba. Depois, a refeição principal: pratos equilibrados contendo uma porção proteica de alto valor biológico, proveniente da carne de frango ou dos ovos, saladas de vegetais crus para acompanhar, incluindo alface, cenoura ralada, tomate e cebola, sempre com “temperos saudáveis” com azeite e limão.

Na lista de compras há ainda hidratos de carbono de absorção lenta, como o arroz integral ou a batata doce. E produtos que servem para “lanches intercalares simples”: além do iogurte, há fruta fresca ou cenoura crua.

São refeições simples, mas equilibradas, defende. E estes são apenas alguns dos exemplos possíveis. Mas a nutricionista deixa um alerta: “É importante termos em mente que nem todos têm as mesmas possibilidades e que muitas vezes acabamos por ter desperdício sem necessidade!”