Aniversários
Parabéns a você, nesta grande e cara festa querida!
As crianças gostam e pedem, os pais pagam as contas. As festas de aniversários já não são o que eram, ou ainda há resistentes pelas celebrações em família?
Bolo, sumos e canções? Para muitas crianças e para muitos pais isso já não chega: as festas de aniversário têm que ser principescas e repletas de actividades. Entre pais e filhos, especialistas e organizadores, fomos ver como andam as celebrações.
As festas de aniversário para amigos e colegas da escola banalizaram-se, sendo comum os pais procurarem sítios especializados com actividades que garantam diversão à partida. Longe vão os tempos em que a festa de anos era apenas reunir em casa família e amigos chegados e os preparativos não incluíam reservas ou confirmações. O que mudou?
Em frente à passerelle cor-de-rosa choque, já se encontra um grupo de meninas sentadas em poltronas individuais da mesma cor, dentro dos seus roupões a condizer. O tom é predominante em toda a sala Play Princess onde decorre a festa de anos. Três princesas adultas apresentam o plano para a tarde, que inclui massagem, manicure, pedicure, pinturas faciais e penteados, para os quais já há materiais preparados nos toucadores prateados de onde vão sair, depois da preparação, para o desfile final, com vestidos espampanantes. Ao som de Girls just want to have fun, a canção de Cyndi Lauper sobre raparigas que querem divertir-se, dá-se início à sessão que tem como objectivo fazer com que as meninas se sintam especiais, como verdadeiras princesas. Essa foi a principal razão que levou Joana Monteiro, de Lisboa, à escolha deste espaço no Playbowling de Cascais. Mãe de Mariana, a aniversariante de 4 anos que juntou as suas amigas às da irmã Leonor, de sete, decidiu ali fazer a festa depois de ter procurado um sítio diferente, fora de casa, para reunir as colegas das filhas. Inicialmente, escolheu o local pela oferta variada de diversões, mas foi na Play Princess que viu a forma de proporcionar à filha um dia diferente “em que ela pudesse brincar o máximo naquilo que ela quisesse”, resolvendo o fascínio do momento “num sítio que parecesse mesmo de princesas”, explica ao Life&Style.
Razões parecidas levam os pais a escolherem outras actividades ali à disposição, diz o gerente Ricardo Almeida, que é da opinião que os pais procuram fazer “algo completamente diferente”, ao mesmo tempo que tentam “satisfazer as vontades dos filhos”. Dá o exemplo das festas de paintball, em que os miúdos vibram logo com os preparativos, ao contrário de uma festa mais tradicional. Conta que antes mesmo de serem levados até aos campos de jogos em carros todo-o-terreno a fazer lembrar “jipes de guerra”, a emoção da festa começa mal se vestem a rigor, com fatos e capacetes camuflados, como tivemos oportunidade de testemunhar pelo grupo animado com que nos cruzámos à entrada.
Não muito longe dali, a Quinta da Ponte proporciona festas de aniversário temáticas. Apesar de ter actividades bastante distintas do local anterior, os objectivos dos pais parecem ser os mesmos. Ao Life&Style, a responsável, Tânia Santos, frisa a ideia de busca de diversões fora do comum: “Os pais procuram poder dar às crianças actividades ao ar livre, de contacto com a natureza, que não têm no centro da cidade”, caso da caça ao tesouro, da visita à fronteiriça Quinta Pedagógica Armando Vilar para conhecer os animais, ou da discoteca para pré-adolescentes, que se encontram entre as escolhas mais populares, refere.
Tânia Santos afirma ainda que as festas para os amiguinhos da escola se tornaram habituais – “se um faz e convida, acaba por ser quase obrigação os outros fazerem” (o mesmo) –, mas ressalva que “nem toda a gente se vê presa a imposições sociais e alguns querem apenas fazer as crianças felizes”.
“Tudo pela felicidade dos filhos”
É exactamente esta ideia de proporcionar o máximo de felicidade possível aos filhos que sobressai, na opinião da especialista em psicologia educacional Leonor Segurado Balancho, na necessidade que os pais têm de fazer uma festa especial de aniversário. “Hoje em dia valoriza-se muito mais os amiguinhos dos filhos do que antigamente”, quando se convidava apenas “os avós, os primos e dois ou três amigos mais chegados” para a festa de anos. Actualmente, “os pais preocupam-se mais com a felicidade dos filhos e fazem mais para que se sintam felizes e para que o partilhem com os amiguinhos”, opina.
Reconhece que a necessidade de sociabilização pesa nas decisões, na medida em que as crianças pedem o mesmo que os amigos têm, mas desvaloriza a evolução para outro tipo de festa como “demonstração social”. “As crianças hoje impõem tudo, pedem tudo, querem tudo”, sublinha, acrescentando que os “pais dão quase tudo o que podem e, se calhar, até o que não podem”. Isso, remata, é cair “um bocadinho num extremo”. Hoje “faz-se tudo pela felicidade dos filhos” e os pais “esquecem-se às vezes um bocadinho deles próprios e da sua própria felicidade em prol da felicidade” dos rebentos. “E é aqui que tem que haver um ponto de equilíbrio”, conclui.
Ana Gomes da Costa espelha essa necessidade. Opta normalmente por fazer as festas de aniversário do filho, de 7 anos, em sítios com actividades. O principal é tentar dar-lhe “o que ele pede”, explica, tentando “conciliar aquilo que quer com o que os amigos possam também gostar”, para que “se possam divertir todos juntos”.
Face à hipótese de um aniversário sem actividades do género, acredita que João se iria “divertir na mesma” mas que ia ficar “desiludido”: “Quando não lhe consigo dar aquilo que quer, ele fica sentido”. Haverá uma eventual mudança de paradigma relacionada com as necessidades das crianças? Ana acredita que sim, fazendo notar uma certa pressão social, através da sua própria experiência: “Pelo que vejo agora, em relação ao ambiente em que o João está inserido, torna-se quase obrigatório fazer estas festas, para a integração no núcleo de amigos. Se ele não fizer uma festa e não convidar os amigos, à partida poderá também não ser convidado (e às vezes acontece). Entre os pais nota-se este sentimento de obrigação para fomentar o desenvolvimento da sociabilização entre eles.”
Por aqui, a tradição ainda é o que era
Há, no entanto, ainda quem resista a esta tendência. Para Carla Coelho de Paula, mãe de duas crianças, este tipo de festas de aniversário tornou-se uma “moda”. Opta por festas mais tradicionais com família e amigos, onde não se corre o risco “de ter que convidar uma turma inteira porque um ou outro convidou” e acha mesmo que “as pessoas hoje em dia dão muito valor à aparência, ao mostrar uma festa melhor do que a outra, convidando todas as crianças, mesmo que não sejam as mais chegadas”.
Como tem espaço em casa, com jardim, prefere juntar de uma vez, e em festa única, todas as pessoas importantes para os filhos: “tento dar-lhes a companhia dos amigos e da família, com um dia de brincadeira; e fazer com que se divirtam, essencialmente”.
E as crianças corroboram. Mesmo a conversar connosco, longe da mãe, Sofia, de 6 anos, diz que o “mais importante” é ter “os amigos e a família” presentes no dia de aniversário e que o que gostou mais na última festa foram coisas tão simples como “brincar à apanhada e às escondidas”. O irmão Tiago, de 11, também diz “que em casa fica mais à vontade e pode receber os amigos que quiser” e até “jogar à bola”, a actividade predilecta. Da mesma opinião, é o colega Gonçalo Luís, de 10 anos, que conta ao Life&Style que o principal, para além dos amigos, é ter a presença da família. Surpreende ao revelar que nem lhe interessam muito as prendas, “é mais o convívio”. E nem faz questão de convidar toda a gente: “só as pessoas mais importantes”.
Controlar os custos
Na hora dos convites, reservas, confirmações e cálculo de custos, os aniversários também se complicaram. É preciso marcar os locais com antecedência e nunca se sabe ao certo se faltam ou aparecem crianças a mais. Face à incógnita, podem ultrapassar-se facilmente as previsões iniciais. Ou dar-se o caso de haver custos desnecessários, devido à falta de comparência, já que o valor é previamente acordado consoante o número de crianças. Foi o sucedido no insólito caso, ocorrido recentemente no Reino Unido, em que uns pais receberam a factura relativa à festa de aniversário de um colega, a que o filho deles faltou, apesar de ter confirmado a presença.
Perante este acontecimento, a reacção das mães com quem conversámos é semelhante: riem-se. Mas nem sempre a questão é para brincadeiras, quando o investimento é avultado. O preço médio de uma festa num sítio especializado ronda os 250 euros, para cerca de dez crianças. E isto normalmente só contempla as actividades. O lanche é habitualmente pago à parte e por cabeça (5 euros, em média).
Às mães com quem o Life&Style falou, o problema nunca se colocou sob esta forma. Mas já o oposto é recorrente: “É comum aparecerem irmãos ou familiares que não estavam convidados e acabam por ficar”, conta Ana Gomes da Costa. Mesmo na festa mais tradicional, Carla Coelho de Paula, confessa suceder-lhe o mesmo: “Geralmente, vêm sempre crianças a mais, sem aviso prévio. Mas nunca me aconteceu virem a menos”, conta. E crianças a mais são custos acrescidos, numa altura em que os efeitos da crise se fazem sentir. No entanto, apesar de terem notado uma ligeira variação nos últimos anos, os promotores destes locais não se queixam de decréscimo no negócio.
Ainda assim, basta passear por qualquer jardim, particularmente ao fim-de-semana e agora que a Primavera se começa a fazer sentir, para concluir que, cada vez mais, parece haver quem opta por festejar fora de casa mas contendo o orçamento. Por parques de merendas e jardins públicos, quase nunca faltam grupos de pequenotes a cantar os parabéns ou piqueniques repletos de crianças. Isto quando as condições meteorológicas o permitem. Quando não, outra boa ideia é recorrer a colectividades ou associações locais. Muitas cedem os seus espaços por preços mais em conta do que as empresas de festas (em geral, consegue-se um bom espaço em redor dos 100 euros) e, normalmente, sem limite de pessoas. Afinal, a felicidade das crianças não tem que custar tanto assim. E, segundo as próprias, pode chegar sob formatos tão acessíveis como “brincar à apanhada e às escondidas” ou “jogar à bola”.