Regis Duvignau / Reuters

A marca Mãe®

Uma mãe é uma marca. Assim que uma mulher dá à luz, nascem duas novas identidades: a do bebé e a da mãe. Esta nova identidade da mulher é a marca Mãe®. Possivelmente, uma das marcas mais antigas do mundo.

Seja pela sua antiguidade ou pela sua universalidade, mas certamente pela capacidade de sobreviver gerações atrás de gerações, a marca Mãe é uma lovebrand. Todos a adoram. A Mãe tem o poder de se manter intacta no coração e preferência dos consumidores, os senhores bebés. Estes são os seus fãs assumidos e, raramente, infiéis. Gostar da Mãe é como gostar de Coca-cola ou de Nutella: quem não gosta, tem pudor em assumi-lo publicamente. “Não contes a ninguém, mas eu não gosto de chocolate.” “Oh, não te apoquentes! Esquisito mesmo é o Manel, que não gosta de Mães.”

A Mãe é top of mind quando se trata de dar resposta às necessidades do consumidor. “Tenho fome!”. Chama a Mãe. “Preciso de dez euros”. Pede à Mãe. “Tenho piolhos na cabeça”. Coça com os dedos da Mãe. Qualquer aflição, a Mãe vem em primeiro lugar. 

A missão da marca Mãe é ter filhos para dar continuidade à espécie humana e cuidar destes até que sobrevivam por si só. Para tal, a Mãe humana ganha vantagem ao parir, quando comparada com outras mães concorrentes da Natureza. Por exemplo, a Mãe-girafa não se consegue deitar para dar à luz, logo, ao nascer, o seu bebé despenca de uma altura de dois metros e meio correndo o risco de partir as pernas e não poder correr para fugir do leão.

Para levar a cabo o seu objectivo, a Mãe, esperta, alia-se ao pai, o outro gigante do mercado com quem divide a quota. O pai pode ou não ter marca registada. Digamos que os seus direitos autorais nem sempre são fidedignos. Depois há alguns parceiros com quem convém manter alianças, as avós e avôs, as tias e os tios. E há ainda outros players no mercado que vão e vêm, as empregadas, amas e professoras preferidas, que interessa manter debaixo de olho e atentar às devidas distâncias do coração dos bebés, não vá a quota de amor diminuir.

É que a Mãe tem o seu posicionamento muito bem definido no território do amor. Qualquer ponto percentual que baixe no final do ano, desvalorizando a marca, leva a uma crise de lágrimas irreversível. Porque é como se sabe: levam-se anos a construir uma marca sólida mas bastam segundos para a destruir.

Atenta ao seu património, a Mãe está sistematicamente a avaliar possíveis ameaças. Vive com medo que algum desastre aconteça ao seu bebé: que caia, bata com a cabeça, se engasgue, tenha febre ou mesmo que não faça cocó. É que, se não fizer um bom cocó, é porque a Mãe prestou um mau serviço ao cliente. E não há tempo a perder porque tempo é amor. O custo/hora do amor da Mãe é baixíssimo e o contrato é sem termo, mas há que activar um plano de gestão de crise para resolver rapidamente este flop. E rápido, antes que o bebé conte a outros bebés que, por sua vez, vão contar às respectivas mães e, amanhã de manhã, as ações da marca, cotadas em bolsa, desçam por aí abaixo.

Como todas as marcas, a Mãe também aposta bastante em promoções - até mesmo antes do seu lançamento no mercado, numa estratégia de pré-adesão. Como há, literalmente, mais mulheres que homens, é fácil encontrar mulheres aspirantes a Mães, dispostas a dar um desconto a quem lhes faça um filho. Uma vez brindadas - e exaustas das noites por dormir - são capazes de acionar ofertas de última hora: “Bebé, se comeres a sopa toda, deixo-te ouvir o Tony Carreira enquanto desfazes o cão de pelúcia”. 

Mas o segredo para o seu grande sucesso, a razão da sua liderança inabalável, é este: não há cópia possível da marca Mãe. Nem na China. Por isso, talvez seja a única marca no mundo inteiro que não vive da ameaça das marcas brancas à venda no mercado. Porque Mãe, para o consumidor, há só uma.

 

Sofia Anjos, 38 anos, directora de contas numa agência de comunicação, foi mãe pela primeira vez em Maio.