No sábado, Alexandre Herchcovitch, provavelmente o nome mais conhecido da moda brasileira desde o seu apogeu na década de 1990, foi beber inspiração junto dos nómadas para construir a sua colecção da cabeça aos pés - dos turbantes aos sapatos vertiginosos e gráficos das modelos - da sua linha Herchcovitch, de gangas e casual wear, para desfilar entre os manequins femininos e masculinos, alguns dos quais de véu e turbante a indiciar rumos saarianos.

Também para Oriente, e com um toque heavy metal, a Espaço Fashion, uma marca pouco conhecida fora do Brasil, pegou num álbum de Iron Maiden para animar a passerelle, para depois a Cantão escrever no solo, a cada passo das modelos, uma cartografia colorida para marcar uma colecção límpida e bem comportada, como é típico da marca, desta vez inspirada pela arte da tipografia. Música, também, com Mallu Magalhães na passerelle para o desfile da 2nd floor, uma linha da marca Ellus.

Mas se a Cantão e Herchcovitch são dois blockbusters, Lenny Niemeyer (neta do arquitecto Oscar), lotou a sala, levantou-a e mostrou como, para qualquer tipo de espectador, encenação e detalhes na apresentação em passerelle que são mais-valias. Sem bundas nem decotes profundos, tal como, aliás, tem sido notório nas marcas de moda de praia, inspirou-se nas diferentes culturas que usam o corpo como expressão da arte e produziu um efeito sofisticado.

Um final em família

A família está à mesa. Chegam os pais, os filhos rebeldes, as crianças, os avós enxutos. Mais família, mais afirmações (um beijo de mulheres), música e celebração. A roupa é um pormenor. O 21º Fashion Rio acabou com uma sala cheia de sorrisos, a lembrar, como o Brasil sabe melhor do que nenhum outro, que o negócio, a indústria, em especial esta, cheia de corpos e de herança, pode e deve ser uma festa. Antes houve biquínis, piadas sobre a crise na Grécia e uma colecção activista sobre quem vive (e é muita gente) na rua no Rio de Janeiro e no Brasil.  

A festa de família foi da marca carioca Reserva, que começou na roupa masculina e se expandiu para a feminina e infantil. O cenário foi o que ficou - um pouco sob a sombra da conhecida campanha da americana Tommy Hilfiger (em que um dos protagonistas é o modelo português Luís Borges) que junta uma família multiétnica nas páginas das revistas de todo o mundo. Entre a encenação, membros da audiência a entraram no jogo, quase como uma flashmob dançante.

A família da moda brasileira, e neste caso dos desfiles no Jockey Club, na Gávea, em pleno bairro verde do Rio de Janeiro, é um pouco isto: bebe influências do exterior, inevitavelmente num mundo globalizado, conhece os seus pontos fortes (e fracos) e monta um bom espectáculo.

Presente no mercado mundial, a moda praia da Triya, o desfile anterior, é variada e mais uma vez não reveladora quanto a imagem que ficou na retina do mundo - a de uma praia brasileira de fio dental e asa delta. A Poko Pano, cuja exportação começou exactamente por Portugal e se expandiu mundo fora, é uma versão mais comercial e conhecida dessa mesma nota. Começou o dia com uma sala cheia e pronta para o seguinte desfile, da Oestúdio, marca conceptual activista que lembrou não só com a sua temática, mas também com o casting mais paritário e etnicamente representativo, o combate à exclusão social.

A meio da tarde, a jovem marca Auslander (tem cinco anos e agora um novo dono), jeanswear e t-shirts com contratos de licenciamento como com a editora de BD Marvel ou parcerias com a clássica Lenny, quis afirmar-se. Um dos seus statements, sendo esta uma etiqueta tão conhecida pelas suas festas quanto pela roupa, foi uma t-shirt com o provocador dizer “Greece failed. Enjoy!”.

Já Andrea Marques, jovem designer sem exportação, apresentou a colecção mais positivamente convencional e límpida do dia de encerramento deste evento de moda brasileiro, ao qual se seguirá, de 11 a 16 de Junho, a São Paulo Fashion Week. O cadinho que é o Brasil é um pouco mais do que um resultado de multiculturalidade. É um quadro de inspirações.

O PÚBLICO viajou a convite da Texbrasil (Programa de Exportações da Indústria de Moda Brasileira)

Corrigido às 11h20 de dia 30 de Maio de forma a escrever correctamente Oscar, sem acento