Óleo de argão
O ouro líquido de Marrocos
Produzido há milhares de anos por mulheres berberes, o óleo de argão está na moda, quer para uso culinário quer estético. O aroma e o sabor fazem dele um tempero exótico muito apreciados por chefs e a fama dos seus resultados na pele e cabelos já conquistou a indústria da cosmética.
Começou a ser utilizado como óleo de cozinha e está entre os principais ingredientes da gastronomia marroquina, que já conquistou chefs por todo o mundo. Mas o óleo de argão tornou-se num super-herói para a indústria da cosmética porque, para além das suas propriedades hidratantes e nutritivas, é também um ingrediente potente no combate ao envelhecimento.
O óleo de argão é extraído do fruto da argânia, uma árvore disponível apenas no território da reserva de biosfera, no sul de Marrocos, numa área florestal de 25.900 quilómetros quadrados, considerada Reserva da Biosfera pela UNESCO. Esta árvore é sagrada em vários aldeamentos berberes, como acontece em Bouzamma, na cidade de Essaouira, no sul de Marrocos. Aí, as mulheres trabalham numa cooperativa dedicada exclusivamente à colheita e à produção do óleo, que depois é vendido a laboratórios de cosmética marroquinos, e daí para fora do país.
É o caso dos laboratórios Azbane que compram o produto às cooperativas femininas berberes e o exportam para 39 países, sendo que os seus principais clientes são spas, hotéis, institutos de beleza e a indústria da cosmética. Saïd Azbane, director técnico destes laboratórios, refere que o óleo de argão está na moda e que os seus milagres têm interessado cada vez mais a classe média, enquanto consumidor, e várias empresas, que buscam um negócio lucrativo. “Toda a gente quer usar, comprar, vender. Mas para se tirar qualquer partido deste óleo, tão caro e raro, primeiro é essencial que seja autêntico, puro.”
O director técnico coloca três regras de ouro para o bom aproveitamento do produto: “em primeiro lugar, há que ter a certeza da sua autenticidade. Segunda regra, ter a certeza de que se paga bem o serviço das mulheres que perdem oito a nove horas para conseguir um litro de óleo, de forma a ajudar essas famílias e, no fundo, a comunidade. Terceira regra, colocar a quantidade suficiente de óleo de argão nas fórmulas dos produtos.”
A colheita do argão faz-se de Julho a Setembro e o fruto seca ao sol durante um mês. A seguir, é descascado com a ajuda de utensílios rudimentares, batendo-se ao de leve na casca com uma pedra. O miolo é cozinhado a lume brando numa panela de barro e depois moído. Passa da água fervida para a fria para arrefecer e depois o miolo é peneirado e decantado. Finalmente, este é filtrado através de papéis ou tecidos, sendo o óleo engarrafado e rotulado.
Segundo o gestor da Coopérative Feminine Bouzamm (CFB), Ayoub Biballa, a primeira cooperativa em Marrocos surgiu em 1997, e aquela que gere tem seis anos. Muitas delas são suportadas por laboratórios de produtos cosméticos nacionais, e aqui os laboratórios Azbane são um dos bons exemplos, uma vez que apoiam 170 destas cooperativas. A produção de óleo de argão acaba por ser, neste caso, o principal ganha-pão de 400 mil famílias, sendo a colheita do argão e a produção do óleo feito por quatro mil mulheres.
Um produto de beleza milenar
As mulheres berberes sempre usufruíram dos benefícios hidratantes deste óleo, mas antes a produção era caseira e apenas para consumo próprio. Ayoub Biballa defende que o aproveitamento deste fruto acaba por ser fomentado pelas condições climáticas a que muitas tribos berberes estão expostas.
“As condições climáticas aqui podem ser extremamente agrestes. Há ventos fortes, o sol é intenso e por isso a pele e os cabelos ficam secos”, facto que despertou a atenção da indústria da cosmética, que hoje em dia incorpora o ingrediente marroquino em cremes faciais de dia e de noite, máscaras de tratamento profundo, bálsamo para os lábios e ainda como desmaquilhante.
Ayoub Biballa explica que este óleo está presente também na medicina tradicional onde é utilizado para tratar certas doenças de pele, como o acne ou a varicela. Pode ainda servir para “massajar bebés, crianças ou mesmo os mais velhos, que tenham reumatismo, de forma a aliviar as dores nas articulações. As mulheres grávidas optam por aplicá-lo na barriga, de forma a prevenir o aparecimento de estrias.”
De acordo com Biballa, este líquido precioso é também delicioso, pois começou por servir como óleo de cozinha e desde então faz parte da gastronomia marroquina: “serve para temperar saladas e pratos de cuscuz, e confere um sabor perfeito à culinária.”
O chef executivo do restaurante Fortaleza do Guincho, em Cascais, também se revela grande apreciador do sabor “detalhado e suave” que este óleo oferece aos alimentos. Vincent Farges utiliza-o com frequência na confecção de alguns pratos, como o carpaccio de peixe, por exemplo, e também para enriquecer as sobremesas, seja num gelado ou numa salada de frutas.
Vincent Farges descobriu este ingrediente nos três anos e meio em que trabalhou em Marrocos. Habituou-se ao óleo de argão puro que chegava à sua cozinha em garrafões de plástico. “O óleo tanto se podia encontrar nos mercados de Casablanca como no mercado negro. As mulheres estão nas bancas a moer o argão e o cheiro que fica no ar é muito bom”, conta.
Hoje em dia, a produção deste óleo para fins culinários já conheceu um grande avanço e, por isso, há uma maior variedade de produtos: “à semelhança do azeite, encontrei óleos de argão extra virgem ou mais tostados, de modo que posso escolher entre um sabor mais intenso e outro mais suave”, diz Farges.
Da pele ao cabelo
Além do sabor agradável, este óleo resgata a beleza da pele e do cabelo. Os laboratórios franceses Pierre Fabre elaboraram, em 2007, um estudo para compreender o alcance dos efeitos do óleo de argão sobre a pele e referem que os resultados obtidos demonstram “notáveis propriedades anti-envelhecimento, de hidratação e de regeneração”, estando comprovado que o produto restabelece a juventude da pele porque aumenta a sua protecção natural e combate a flacidez, característica da pele menos jovem.
São diversas as marcas de cosmética que possuem um produto ou uma gama de produtos à base de óleo de argão. Uma delas é a Galénic que, de acordo com a responsável pela marca em Portugal, Tânia Fraga, foi pioneira na utilização deste óleo há 25 anos. A marca lançou recentemente a Argane, uma gama exclusiva de cremes para rosto e corpo à base do óleo de argão destinada a peles secas e muito secas. Segundo Tânia Fraga, esta é umas das linhas da Galénic mais procuradas pelas consumidoras.
No grupo L’Oréal, o óleo de argão está presente sobretudo em produtos para o cabelo. É o caso do Oilixir, um óleo nutritivo multi-aplicações para cabelos secos, que é formulado com óleo de argão orgânico. Também a Kérastase (outra marca do mesmo grupo) começou há um ano a investir na utilização de óleo de argão e, segundo a responsável pela marca a nível nacional, Cidália Ferreira, o primeiro - e único - produto com óleo de argão, o Elixir Ultimate, surgiu por essa altura.
Saïd Azbane, dos laboratórios Azbane, defende ser possível usar o óleo de argão puro na pele ou no cabelo por ser natural. Em princípio, tratando-se de um óleo natural, só uma pessoa que seja alérgica ao argão é que poderá ter uma reacção negativa ao óleo, e Azbane refere que são raros os casos.
Mas Laura Luciani, técnica da empresa Davines Hair Care, acrescenta que um produto com óleo de argão pode ser utilizado diariamente, mas refere que “caso se utilize óleo puro nos cabelos, estes podem tornar-se oleosos”.
Para Luciani e Azbane, o essencial é a qualidade e a pureza do ingrediente. Já a quantidade de óleo num produto depende da fórmula e dos responsáveis pela mistura, sendo que “a quantidade determinará sempre o seu efeito” e a virtude está quase sempre no meio.