Série cinco bloggers, cinco estilos

A Pipoca Mais Doce, a marca

É caracterizada como fútil em blogues da concorrência, mas Ana Garcia Martins conseguiu o que muitos ambicionam e poucos conseguem: fazer do seu blogue o seu principal ganha pão. Mais do que isso, A Pipoca Mais Doce, o quinto blogue mais lido em Portugal com 12 milhões de visitantes únicos desde que foi criado e 20 mil visitas diárias, é uma marca comercialmente apetecível e em expansão. É um livro, é um CD e, muito em breve, poderá ser toda uma linha de moda. Está visto, este blogue vende que nem pãezinhos quentes.

Ana Garcia Martins, 30 anos, blogger e jornalista, autora de A Pipoca Mais Doce desde 2003, considera que em Portugal “as marcas e empresas estão finalmente a despertar para o fenómeno dos blogues e a perceber que a comunicação nesta plataforma recebe um feedback mais imediato do que através de uma página de revista ou de um anúncio na televisão”. Ana Garcia Martins lembra que em Portugal há poucos bloggers profissionais assumidos e que, neste momento, está a apostar em tornar “rentável e mais profissional” a sua actividade na blogosfera.

O Clix.pt, que hospeda e explora o blogue comercialmente desde o início do ano, tem sido contactado por várias marcas de moda, beleza, produtos de higiene e estética que publicitam através de banners e skins na página de A Pipoca Mais Doce. A Direcção de Comunicação Institucional da Optimus conta ao Life&Style que esta parceria – tal como a celebrada com O Alfaiate Lisboeta – partiu de um convite da Optimus no sentido de “integração [no Clix.pt], em exclusivo, dos blogues nacionais mais acedidos e consultados no que respeita a informação sobre tendências de moda, estilos urbanos e um olhar atento e bem-humorado sobre a vida”.

A autora do blogue – e também editora da secção de consumo na revista Time Out em part-time - garante que estas marcas “não têm qualquer interferência nos conteúdos editoriais” e que a rentabilidade, para já, não se traduz num valor fixo mensal. “Ainda há muita margem para o crescimento”, acrescenta Ana Garcia Martins. A direcção do Clix.pt afirma, por sua vez, que blogues como A Pipoca Mais Doce e O Alfaiate Lisboeta “constituem uma enorme mais-valia para a marca Optimus”, pela sua popularidade e por irem ao encontro das necessidades e expectativas dos clientes da empresa. Salienta ainda que a blogosfera é “um meio cada vez mais valorizado, com retorno de investimento bastante positivo, e com forte tendência para competir com os meios tradicionais”.

A Pipoca Mais Doce – “um blogue generalista [feito] de uma mulher para mulheres” que surgiu numa altura em que não havia blogues de moda em Portugal, segundo a autora – é também desde o início do ano uma marca licenciada. A ideia partiu de uma agência de licensing, a Zero e Oito.

Esta agência tem na sua equipa profissionais que diariamente acompanham a blogosfera, sobretudo os “blogues com maior sucesso, independentemente do seu conteúdo”, conta Madalena Castro, da Zero e Oito. “Seguimos vários blogues não só para encontrar potenciais marcas, mas para encontrarmos as tendências e gostos dos consumidores”.

Sensível aos números anotados pelos “olheiros” da agência - 5º lugar no top dos blogues em Portugal, 12 milhões de visitantes únicos desde que foi criado e 20 mil visitas diárias -, a Zero e Oito lançou o repto de tornar A Pipoca uma marca. Ana Garcia Martins respondeu afirmativamente. “Claro que estes números são relevantes quando estamos a avaliar o potencial de uma marca para licenciamento, mas mais do que isso são os pequenos exemplos que testemunham a influência directa da autora junto do seu público-alvo”. E quais são os valores que pretende transmitir a marca A Pipoca Mais Doce? “Fashion, diversão, mulher moderna, utilidade, inteligência”, responde Madalena Castro.

Como modo de se posicionar no mercado, a marca foi lançada com a edição de um disco com as preferências musicais de Ana Martins [de Rufus Wainwright a Marvin Gaye, passando por La Roux]. Esta é a estreia da Pipoca enquanto marca no mundo dos produtos, embora uma compilação dos textos publicados no blogue já tivesse sido publicada pela Oficina do Livro, em 2009. Actualmente, a blogger está a desenvolver com uma criadora de moda uma linha de roupa, dirigida a mulheres dos 20 aos 40 anos. Se passar o teste do mercado, poderá seguir-se uma linha de acessórios e sapatos. A ideia é lançar linhas de produtos que Ana Martins utilizaria. Só assim, adianta a blogger, faz sentido.

A Pipoca Mais Doce não é um blogue de moda “pura e dura”, afirma Ana Martins. É uma plataforma – “interessante, inovadora, [que está] a chegar a muita gente” – na qual, servindo-se de um tom pessoal, “quase intimista”, a autora vai partilhando o que se passa no seu dia-a-dia. Ana Martins publica no blogue “coisas banais” como uma série de looks que aprecia, os sapatos que comprou ou as aventuras com o seu Pipoca Móbil [nome com o qual baptizou o seu carro], lado a lado com preocupações sociais como a precariedade que afecta a sua geração. No blogue, adianta, pode recorrer a um registo de escrita que enquanto jornalista lhe é vedado. “Queria explorar um lado mais criativo e humorístico, escrever o que e como me apetecesse”, refere ao Life&Style.

Sobre o sucesso na blogosfera Ana Garcia Martins é peremptória: “Os blogues vieram democratizar o acesso à moda e às tendências”. A autora de A Pipoca Mais Doce admite que os bloggers tem um trunfo que lhes dá vantagem sobre os outros ditadores de modas: “São mais realistas do que editores de moda na Vogue. As pessoas vão aos blogues e vêem que podem fazer um look facilmente com peças da Zara e da H&M”.

Como resposta às dúvidas que as relações comerciais nestes blogues podem levantar, Ana Martins pretende implementar uma ideia que gostava que se estendesse a outros blogues em nome “da transparência e da coerência”: a identificação clara dos conteúdos. É indispensável “assumir o que é aquele post, se é pago, se é uma opinião genuína, ou uma descrição de um produto oferecido”, para evitar dúvidas entre os leitores.

Entre equívocos face às motivações por trás de certos posts e críticas ao registo confessional do blogue, o fenómeno A Pipoca Mais Doce vai produzindo ecos menos açucarados na blogosfera. Como por exemplo o que ressoa num “contrablogue” chamado A Pipoca Mais Azeda. A primeira entrada desse blogue, criado em 2010, avisava, desde logo, ao que vinha: “Qualquer semelhança com outros blogues fúteis, triviais e parvos, já existentes, é pura ficção”. De acordo com um passatempo online da Red Q by Delta Q, a autora do blogue A Pipoca Mais Doce venceu a eleição da “Mulher Mais Invejada de Portugal”. O que estava em causa, neste passatempo, era seleccionar “a mulher que mais inspira os portugueses através da sua forma de pensar e escrever”.

 

Artigo actualizado às 18h40 de 8 de Setembro