Miguel Manso

Os seus óculos de sol têm filtro UV?

Chega o Verão e os avisos sobre os perigos do sol regressam. Protector solar, chapéu, evitar as horas de maior calor, usar roupas leves e claras, beber muita água. Mas a importância de usar óculos de sol com protecção contra os raios ultravioleta ainda passa despercebida. O que se torna ainda mais preocupante se tivermos em conta que usar óculos sem filtros UV pode fazer pior do que não usar nenhuns.

As campanhas de sensibilização para os riscos da exposição aos raios ultravioleta (UV) têm tornado a utilização de protector solar um hábito entre os portugueses. Hoje em dia, até há quem lhe junte o protector para o cabelo ou o batom para os lábios. Mas e os olhos? Segundo José António Tenente, criador português que tem uma linha de eyewear desde 2004, “grande parte dos consumidores preocupa-se essencialmente com a imagem, com o look e design da peça, nomeadamente quem os utiliza mais como acessório e não tanto como necessidade”.

Contudo, os óculos de sol, desde que tenham as lentes adequadas, são a melhor forma de proteger os olhos dos raios ultravioleta, causa de diversas lesões oculares ao nível da córnea, conjuntiva, esclera, cristalino, retina ou pálpebras. A curto prazo, estes raios podem provocar conjuntivite ou fotoqueratite (frequente quando a exposição se associa a vento frio ou neve), mas estas lesões são geralmente temporárias e menos preocupantes do que os danos causados por uma exposição crónica aos raios UV, associada à não utilização no dia-a-dia de óculos de sol que filtrem a luz ultravioleta.

A exposição constante e continuada à radiação solar pode provocar cataratas, aumenta o risco de melanoma na pele das pálpebras e está associado a lesões da conjuntiva, “como o pterígeon (crescimento da conjuntiva que invade a córnea) e pinguécula (lesão amarelada da conjuntiva)”, explica José Pedro Silva, secretário-geral da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia (SPO). Mas a doença mais preocupante é a degenerescência macular relacionada com a idade, principal causa de cegueira em pessoas com mais de 50 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde.

As lesões “vão-se desenvolvendo e muitas vezes [as pessoas] não se apercebem”, refere Manuela Carmona, presidente da SPO. Por isso, prevenir é a melhor solução: “evitar a exposição excessiva à radiação ultravioleta – principalmente nas horas em que os raios UV são mais fortes (das 11h00 à 16h00)” – , utilizar chapéu – “de preferência largo” – e “protecção solar ao nível das pálpebras”, são alguns conselhos avançados por José Pedro Silva. Há ainda que ter em conta a variação sazonal da irradiação solar (embora se deva proteger os olhos dos raios UV durante todo o ano, mesmo nos dias nublados), a altitude e a proximidade com superfícies reflectoras, como a neve, a água ou a areia. Mas “o método mais eficaz de protecção dos olhos da radiação é usar óculos com lentes com protecção UV”, avança o oftalmologista.

Usar óculos sem filtros UV é pior que não usar nenhuns

A utilização de óculos de sol tem como objectivo reduzir o cansaço visual, aumentar a percepção e, principalmente, proteger os olhos contra a radiação solar excessiva. Contudo, como acentua a norma europeia que regula este tipo de filtros (EN 1836:2005+A1), “além da redução do brilho visível, a protecção dos olhos deve ser assegurada no espectro ultravioleta”. Assim, os óculos de sol, por mais escuros que sejam e capazes de bloquear grande parte da luz, nada fazem contra os raios ultravioleta se não tiverem os filtros adequados. Aliás, a cor das lentes não tem qualquer influência na sua capacidade para filtrar a luz UV, antes pelo contrário: nos casos em que os óculos não têm filtros, quanto mais escura a lente for, mais danos pode causar.

“Os olhos têm vários mecanismos de defesa em relação à luz – como pestanejar, fechar os olhos e a pupila reagir, contraindo-se e limitando a quantidade de radiação que chega à retina”, explica Manuela Carmona. Quanto mais escura for a lente, melhor “bloqueia a luz visível, enganando este sistema de defesa”. Como tal, a pupila não reage, mantendo-se dilatada, o que faz com que, no caso dos óculos sem filtros UV, “uma maior quantidade de raios entre no olho e provoque lesões oftalmológicas”, complementa José Pedro Silva.

Desta forma, torna-se peremptório utilizar uma protecção adequada: lentes com boa qualidade óptica (para evitar a distorção das imagens) e, sobretudo, capazes de bloquear a radiação UV entre 80 e 100 por cento e a luz visível entre 75 e 90 por cento. Para além disso, devem ter um formato que se ajuste às feições do rosto, para proteger os olhos em todos os ângulos, nomeadamente da incidência lateral.

Cuidados a ter na hora da compra

Na altura de comprar um novo par de óculos de sol deve-se procurar, antes de mais, a marca CE – que certifica que estão homologados segundo a directiva da Comissão Europeia – mas só isso não chega. A norma técnica relativa aos filtros solares não é obrigatória, embora Teresa Moreira, directora da Direcção-Geral do Consumidor, refira que “as normas adoptadas pelos organismos europeus de normalização, apesar de serem documentos de seguimento voluntário, assumem por vezes um estatuto quase legal”, constituindo-se como “normas de referência”. Ainda assim, embora a maioria dos óculos de sol tenha filtros contra os raios ultravioleta – e quase todos os que encontrámos no mercado tinham –, não é garantido ou obrigatório que todos tenham este tipo de protecção.

Depois há que procurar a indicação relativa aos filtros UV, que pode estar colocada nas lentes (em forma de autocolante ou holograma), no interior das hastes, na caixa dos óculos, etiqueta ou num certificado entregue no acto da compra. A protecção indicada deve ser, preferencialmente, “UV100%”, “protecção 400” ou filtro 3 ou 4, estes segundo a categoria standard da CE. Em qualquer um dos casos a filtragem de raios UV é a mais desejada, mas há que ter em consideração que em caso de filtro 4, categoria máxima, a cor da lente é também a mais escura, não sendo indicada para conduzir.

Mesmo assim, não é certo que tudo seja integralmente cumprido ou que os selos não sejam contrafaccionados. Por isso, a Deco, num artigo escrito em Julho do ano passado, recomenda a compra de óculos de sol em lojas especializadas. Todos os óculos vendidos nas ópticas têm, à partida, filtros UV e os de design português representados pela Proóptica também “são acompanhados por um certificado de garantia, que certifica a protecção contra as radiações ultravioleta”.

Para José António Tenente (parceiro da Proóptica), o processo de criação de um novo modelo de óculos tem como ponto de  partida a protecção solar: "Quando estamos a desenvolver uma nova colecção essa é uma questão de fundo que está sempre presente e que portanto está equacionada. O gabinete de desenho, tendo isso em conta, parte livremente para a criação". Miguel Vieira, criador de moda que também tem uma linha de óculos de sol e armações, refere que "a primeira preocupação é com a parte estética, a ergonomia dos óculos, os mil e um materiais possíveis em termos de componentes e cores e acabamentos”. Ambos contam com parcerias técnicas na produção das lentes que garantem que todos os seus óculos de sol têm protecção contra os raios ultravioleta, por “uma questão de qualidade e protecção”, reafirma Miguel Vieira.

Artigo corrigido às 19:15 de 17 de Agosto