• João M. Barbosa trabalha com a filha, Teresa
    João M. Barbosa trabalha com a filha, Teresa DR
  • Das vinhas no Alentejo e Teno nascem os vinhos das marcas Lapa dos Gaivões e Ninfa
    Das vinhas no Alentejo e Teno nascem os vinhos das marcas Lapa dos Gaivões e Ninfa DR
  • Durante as vindimas
    Durante as vindimas DR
  • Durante as vindimas
    Durante as vindimas DR

As caras por trás das marcas

João M. Barbosa continuou o legado de família, mas fez o seu caminho

O avô começou a vender vinho a granel, em 1950. João M. Barbosa traçou a sua própria rota e celebra este ano 20 anos de história.

“E para acompanhar?”, interrogava Herman numa campanha publicitária dos anos 1980. No seu fato xadrez e gravata encarnada e verde, com bochechas coradas e “monocelha”, produzia então a resposta, pegando na garrafa de vinho e rimando: “Teobar!”. Foi este um dos primeiros vinhos de mesa engarrafados em Portugal — uma combinação do primeiro e último nome de Teodósio Barbosa, que nasceu das Caves Dom Teodósio.

No final dos anos 1990, as caves foram vendidas, mas, duas gerações depois, a família continua ligada ao vinho, com a empresa João M. Barbosa – que celebra 20 anos. O neto de Teodósio tem hoje quase dez hectares de vinha em Rio Maior, onde o negócio de família começou décadas antes. É desses terrenos que saem hoje, respectivamente, os vinhos das marcas Lapa dos Gaivões e Ninfa. Produzem-se tintos, brancos, rosés, espumantes blanc de noirs (com uvas tintas) e até azeite.

O regresso de João M. Barbosa ao vinho deu-se em 1997, quando estava a trabalhar noutra área e foi abordado pelo Pão de Açúcar, que queria começar a oferecer uma marca de vinho exclusiva. Fez uma proposta à superfície comercial e ganhou. Comprava, portanto, o vinho a granel e engarrafava com a marca Marquês do Rio.

Há algumas semelhanças com o percurso do avô, que começou a vender vinho em 1923. Na altura “comprava o vinho em granel, armazenava e vendia em pipas”, conta João Barbosa. Depois, em 1945, decidiu focar-se apenas nesse negócio – até então vendia também madeira – e uns anos mais tarde, em 1959, foi um dos pioneiros na venda de vinho de mesa engarrafado, com o Teobar. Nesse ano, “houve três empresas que começaram a engarrafar vinhos a preços económicos”.

Os pais também estiveram ligados ao vinho durante algum tempo. A família mudou-se para Angola no final da década de 1950, onde o pai importava vinho e mandava de volta bens, como o feijão – na altura não podia enviar dinheiro para Portugal. Mais tarde, João mudou-se com o pai para a Alemanha onde mantiveram o negócio de importação. Voltou para Portugal em 1981, como vendedor das Caves Dom Teodósio.

Voltando a um passado mais recente, a empresa de João M. Barbosa começou entretanto a aumentar a área de negócio: por um lado, passou a fornecer mais supermercados, como o Minipreço e o Lidl, com diferentes marcas exclusivas; ao mesmo tempo comprou terrenos – no Alto Alentejo, em Portalegre, e em Rio Maior – e a plantar vinhas de raiz.

São as vinhas que o fazem, em 2013, tomar a decisão de cortar com o negócio de engarrafamento de vinho a granel, passando de uma facturação anual média de dez milhões de euros, para aproximadamente 600 mil. “Este ano se tudo correr bem facturamos 900 mil”, revela. Durante anos, o lucrativo negócio era também uma forma de financiar o crescimento da produção própria de vinho. A certa altura, conta “aquilo que nos estavam a exigir era tanto que para nós já não fazia sentido”. Não foi uma decisão fácil. “E em termos psicológicos [foi] muito difícil depois aguentar os dois anos seguintes.” 

Hoje a João M. Barbosa tem duas adegas, dez hectares de vinha no Alentejo e quase dez no Tejo – “não tinha um metro de terreno em 1997”, nota com um meio sorriso. Mas o neto de Teodósio não está na corrida da quantidade. Quando atingir o tal número redondo – “se tudo correr bem, no próximo ano” – não plantará “nem mais um metro”. Em termos de garrafas, a produção anual ronda as 70.000 e o objectivo é chegar às 100.000.

O produtor não quer crescer mais em área, mas sim em qualidade. “Quero fazer coisas muito boas. Felizmente a minha filha trabalha comigo e pensa da mesma maneira”, diz. Além disso, prefere dedicar-se àquilo que lhe dá mais prazer: “Já estou numa idade em que felizmente posso fazer isso. As coisas têm de me dar algum gozo. Já sei o que são coisas grandes e não quero.”

Um desses prazeres foi começar a produzir espumantes Blanc de Noir no Tejo, em 2007. Não está certificado como vinho da região, pois no primeiro ano chumbou na câmara de provadores, por não ter as características típicas – e também nunca voltou a ser enviado. Levantada a questão, partilha a sua opinião sobre o tema das certificações: é defensor acérrimo do direito de cada produtor “preservar” aquilo que a terra lhe dá e, ao mesmo tempo, apoiaria que nas regiões não permitissem castas internacionais para fazer os vinhos DOC. Em suma, “apesar de ter um pinot noir tinto DOC do Tejo, sou contra isso”.

Em 2011 e 2013 não lançou espumante, pois atrasaram-se nas vindimas e a “as uvas já tinham perdido acidez”. Da mesma forma, recusa-se a engarrafar quando o vinho não atinge a qualidade necessária, como aconteceu em 2014, com os tintos. “Não ponho o meu nome nisso”, diz decididamente.

Apesar de não ter tido treino formal em viticultura, aprendeu fazendo e hoje tem mão em todo o negócio – da plantação à comercialização, passando pelos tratamentos e vindimas. “O meu avô nunca quis ter vinhas”, conta. “Dizia que as uvas são para os agricultores e ele não era agricultor”, brinca. “Mas os tempos mudam” e, “felizmente”, acabou por comprar. “Pena não ter havido tempo para fazer coisas diferentes.”

No final da apresentação dos vinhos de 2016, em Lisboa, João M. Barbosa brinca que quer que as garrafas cheguem aos 50 euros – e daí continuar a crescer em qualidade e valor acrescentado.